terça-feira, janeiro 03, 2006

Credo

Não somos nós que somos Deus, nem sequer parcelas ou faíscas. Nada fora de Deus é Deus, não há nada de outrém em Deus: a Sua indivisibilidade é total. Mas tudo é em Deus, e nós também.

Ele tocava-nos, na impossibilidade de o tocarmos nós a Ele. Até ao dia em que a sua palavra se concentrou num rosto e presença humana, e nos tocou a partir de nós próprios e por dentro.

Deus é anterior a tudo o que seja. Puro princípio e simultaneamente pleno, nada decorre necessariamente Dele - nem o mundo, nem o ser, nem nós. É absolutamente indeduzível. Pode-se dizer que algo deve presidir ao puro e bruto facto de haver coisas, aqui, nós e a janela e a noite lá fora e o cinzeiro e a caneta e o outro a respirar ao nosso lado e por aí fora no tempo e no espaço e no além possivelmente. Mas determinar na inteligibilidade de conteúdos isso que se pressente no cerne da vida a partir dela própria - não o podemos.

Se está à mão, não é Deus; se não está à mão, não me é nada.

Deus é mediador de si próprio em Cristo. É aí o seu acesso. A ininteligível Trindade, e a afirmação incompreensível da consubstancialidade, são o garante do acesso. O cristianismo é um excesso total perante a existência, que pretende desbloquear esta das suas aporias. Deus aqui não é uma conclusão mas um ponto de partida; mais do que tentar entender a Trindade e a Revelação, trata-se de nos tentarmos entender e viver a nós próprios a partir delas. E a conclusão, por ora e como se diz - só a Deus pertence.

20 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Caro amigo.É sempre com agrado que registo a amabilidade de ficar "ligado"...sinal que alguma coisa pode significar a modéstia do meu blogue e por extensão a minha pessoa.E como estas coisas se retribuiem mais do que se agradecem terei mt gosto em fazer o mesmo, até porque temos pontos em comum como me foi dado observar numa primeira impressão.Que o nosso diálogo se prolongue.
Um abraço do Morfeu

4:11 da tarde  
Blogger timshel said...

excelente post

4:38 da tarde  
Blogger maria said...

Quando eu for grande, quero uma fé assim...

Vítor, não vale a pena repetir o óbvio, mas há que dizer:
está aqui um credo que te saiu das entrahas. É a Encarnação, é a Encarnação...

Diz o "nosso" querido Varillon:"Amar é querer que o outro seja!". Eu quero que tu sejas, cada vez mais, de Deus.

Abraço grande

6:30 da tarde  
Blogger xana said...

Vezes sem conta se pergunta"Onde é que está Deus?" Eu por vezes me pergunto "Onde é que Deus não está?!!!"

Deixo-lhe aqui e também a todos, dois mil e seis beijinhos.

7:17 da tarde  
Blogger Sonia Almeida said...

Dei uma olhada por todo o blog, embora não tenha tido o tempo de o ler com a devida atenção.
Mas impressionou-me este primeiro contacto, e nos dias de hoje é preciso ter coragem para se assumir que se é cristão.
Agradeço o link, voltarei com certeza, eu que ando sempre a braços com a minha falta de fé, e com os esforços que Deus faz para que eu não o expulse da minha vida.
Beijinhos grandes e um excelente começo de 2006

6:47 da tarde  
Blogger Davide Vidal said...

Como Paulo aos Romanos: (Romanos 11:31 a 34) - Assim também estes agora foram desobedientes, para também alcançarem misericórdia pela misericórdia a vós demonstrada; Porque Deus encerrou a todos debaixo da desobediência, para com todos usar de misericórdia; Ó profundidade das riquezas, tanto da sabedoria, como da ciência de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos, e quão inescrutáveis os seus caminhos; Porque, quem compreendeu a mente do Senhor? ou quem foi seu conselheiro

12:21 da tarde  
Blogger Vítor Mácula said...

Caro Morfeu.

Faço minhas as suas palavras, e devolvo-lhas a si dirigidas.

Um abraço.

3:30 da tarde  
Blogger Vítor Mácula said...

Caro Timshel.

God spits in my soul
There' s something dead inside my hole

Se Ele não tivesse vindo humano, era assim que o pensentíriamos (ou melhor, penso que seria esse o meu caso).

Um abraço com a "Jesus and Mary chain"!

3:32 da tarde  
Blogger Vítor Mácula said...

Querida MC.

Lá estás tu, lá estás tu… Pois olha que, de “fora” e à net-distância, e ressalvando que qualquer fé é sempre ínfima relativamente à sua completude, eu diria que tu tens uma fé “assim”… Lá as crises de fé e de vida e de sentido… bem… quando orientadas pela fé, são seu alimento. Não é a dúvida que se opõe à fé, mas sim o pecado… Abraão, Job, etc… duvidaram e choraram e interpelaram e confundiram-se e agitaram-se e etc… E Cristo no Jardim das Oliveiras e no Calvário, também mostra muito acerca da dinâmica da fé. Eu até diria, em jeito de butade: Quanto mais dúvida, mais fé… que esta não é bem um “saber”. A fé viva e autêntica, se não se sobressalta, é porque é uma mesmo que fantástica representação pendurada na parede duma casa que não habitamos e não nos habita. Dá para julgar o mundo e pensar que se detém a verdade em forma de saber e de poder… mas suspeito que não é isso que move montanhas. O que importa na fé é renascer em Cristo na inteireza (e isto de ser dado à luz nunca foi “sereno”…)

Mas isto sou eu, que falo demais, isto é, sem muitas certezas.

Quanto ao teu querer, que me toca no fundo do coração, desse mesmo fundo to retribuo.

Um grande abraço.

3:40 da tarde  
Blogger Vítor Mácula said...

Cara Xana.

E a pergunta seguinte é: E o meu coração, onde está?

Fantástica, essa dos dois mil e seis beijinhos!
Outros tantos para si!

3:40 da tarde  
Blogger Vítor Mácula said...

Caro Zé Beirão.

Embora não o "conheça" há tanto tempo, contacto e leituras do que a MC, suspeito que o que papagueei acerca da fé no comentário acima e à MC dirigido... também se aplica a si. (Enfim, suspeitas de quem fala demais...)

Um grande abraço.

3:43 da tarde  
Blogger Vítor Mácula said...

Cara Sónia.

Pois, comigo passa-se o mesmo. Mas olhe, quanto à falta de fé e aos esforças de Deus... não será precisamente essa a dinâmica da conversão, isto é, da fé?...

Como se vê, a coragem requerida, não é de hoje (se bem que é evidente que nós agora vivos, temos de nos preocupar é com a de hoje).

Beijinhos no coração, e bom ano!

3:46 da tarde  
Blogger Vítor Mácula said...

Caro Ego Ipse.

Nem mais! Como sempre no grande Paulo, o "mais" pequeno... É por causa destas (e evidentemente por outras) que ando sempre com um Novo Testamento de bolso... no bolso!

Fico sempre meio varado quando se pretende "atacar" Paulo, e nos dias de maior irritabilidade e desgraça, fico quase intolerante.

Como numa vez perante um texto do D.H. Lawrence em que este pretende mostrar como Paulo inverteu em morte a proposta vitalista de Jesus. Não que o texto não indique também coisas interpelantemente certeiras, mas tem como que uma incompreensão total de que a superação da morte no cristianismo não anula esta, muito pelo contrário. Quero dizer, sei lá, talvez tenha de reler o texto do Lawrence com menos irritação, mas pronto.

Um grande abraço.

3:50 da tarde  
Blogger maria said...

Ahahah

só para te ver "papaguear" assim, dá gosto vir aqui pôr um comentáriozinho.

Pois é, pois é...sou uma queixinhas choramingas sempre a olhar para a galinha da vizinha.

Tens razão, a fé não é, essencialmente, um saber. Mas a cada momento, somos impelidos, a dar as razões da nossa fé. Daí que dentre outras coisas o saber dizer também é importante.

O que é muito bom de ver em ti, é o frescor, que tem o seu contexto próprio, mas que, tenho a certeza, extravaza o contexto.

Depois, fé que não saia das entranhas, não moverá, nunca, montanhas.

E a verdade será sempre:"Se tivesseis fé do tamanho do grão de mostarda..."

Agora, vou meter-me um bocadinho com o Zé.

Tens razão, quando intuis que ele também está a ser um bocadinho "queixinhas choramingas". Deve ser algum malvado "carisma feminino" que lhe está atravessado. Temos que tratar disso. ;)

Abraços, sempre

PS- Obrigada por TUDO. Recebi os recados.

5:28 da tarde  
Blogger Vítor Mácula said...

Alô, alô, MC.

Bem, choramingas e queixinhas também eu sou, e mantenho-me! Não foi Ele que disse para Lhe chamarmos "Paizinho" (abba). Todas as manhãs e noites Lhe peço para dar-me fé, entre outras choraminguices que aqui não digo.

O que eu suspeitei no Zé Beirão - e daí o abuso - é que ele também tem uma fé "assim". É uma forma também de dizer que gosto muito da sua presença lá no seu próprio blogue e comentários avulso.
Um blogue sobre as "pessoas da sua vida" - poderá ser-se bloguisticamente mais amoroso?!... É caso para dizer: Venha a fé e diga...

Um abraço.

5:42 da tarde  
Blogger maria said...

Bien, bien (hoje estou numa de chic).O carisma feminino é uma brincadeira minha e do Vítor, surgiu, penso, por causa do D. José Policarpo e os carismas femininos.

Eu (e não só), tenho a mania, que a prática muitas vezes desmente, que determinadas formas de ser/sentir estão implicitamente ligadas ao género feminino ou masculino. Neste contexto, achava que o "queixinhas choramingas" se me colava naturalmente por ser mulher. A parte da provocação é que tu, sendo homem, também eras assim um bocadinho. Afinal, o Vítor, vem baralhar isto tudo e diz que, também é. Resultado, somos três - dois homens, uma mulher - e estamos todos para o mesmo. Logo, ser "queixinhas choramingas", não é um carisma feminino. Será outra a classificação que não sendo de género, temos de descobrir qual é. Isto vai tirar-me o sono, vou procurar uma resposta. Como é que três adultos (dois homens e uma mulher) maduros e amadurecidos na militância da vida, são uns "queixinhas choramingas"? Será que fazemos parte de uma minoria? Devemos criar uma associação?:"Protejam os queixinhas choramingas, que estão em vias de extinção"
Não será de encomendar uma sondagem para ver/conhecer as reais proporções disto?

(Meu Deus, um post tão bonito e eu para aqui a dar cabo disto tudo.)

A propósito, Zé, estou a lembrar-me que amanhã é dia de Reis, não tens nada para dizer sobre isso. Inventa aí uma história que eu em troca mando-te uma fatia de bolo-rei (já do Natal).

"A minha fé é tão instável, não por causa das dúvidas, mas por causa do pecado..."

Obrigada, do mesmo me queixo eu. Ando para aqui às voltinhas, às florzinhas, para não ter que dizer: também eu, também eu.

E meu caro fornecedor de antena, Vitor de teu nome, quando dizes que o Zé é amoroso bloguisticamente, estás a ser muito redutor. Eras capaz de imaginar um blog sobre as pessoas da tua vida? Eu não. Pensava para aí numas cinco ou seis, vá lá meia dúzia, e desistia da ideia. Agora reconhecer ternura em três pares de meias e no lume aceso, (embora isso me levante algumas questões)que por timidez não escrevo....é de alguém que vive com muita amorosidade a vida. Não? Podemos falar assim à vontade, porque isto é só uma conversa entre nós os três, ninguém vem aqui ler ;)

Ai, que são horas de jantar e pôr a render os meus carismas femininos...

Até amanhã

8:01 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Olha, é mesmo só para dizer que me fartei de rir com as vossas conversas... com as vossas entrelinhas. MC, Vitor, Zebeirão. Que mistura, meu Deus. Afinal, faláveis de fé?

10:36 da tarde  
Blogger Vítor Mácula said...

Cara MC.

Butade: reduzir seja o que for ao amor é abri-lo a todo o resto, invertendo a redução em universalidade (que pena o termo catolicidade estar linguistica e culturalmente a perder este sentido...)

Mas claro que percebi o que querias dizer...

Beijos.

1:42 da tarde  
Blogger Vítor Mácula said...

Caro Zé Beirão.

Nem sei o que dizer perante o seu vendaval sereno de fé, amor e vida... É difícil exprimir certas comoções e gratidões apenas com palavras escritas.

Seja como for, penso que alguém para quem a dádiva de três pares de meias o faz avançar na fé, precisa menos de longos tratados de teologia do que, por assim dizer, precisam estes dele.

E não desculpo nada, que de maneira nenhuma foi longo demais.

Muito obrigado, e um grande abraço.

1:43 da tarde  
Blogger Vítor Mácula said...

Caro Confessionário.

Fez-me lembrar um provérbio judeu, que reza assim: Sempre que o homem pensa, Deus ri. (eh eh!)

E penso que o amigo Zé Beirão nos brindou aqui, em linhas e entrelinhas, com um dos melhores "tratados" acerca de fé que eu li até hoje. Nem sei se não devia, com a permissão devida, dar-lhe a visibilidade dum post...

Um grande abraço.

1:46 da tarde  

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