Estou em crer que há uma linha teológica tradicional que vai pela assexualidade. Esta era vista em relação exclusiva com a corporeidade, de modo que não fazia sentido considerá-la relativamente às realidades espirituais. Daí a história do sexo dos anjos, ou a leitura daquela frase de Jesus: «No reino dos céus, nem eles se casam nem elas se dão em casamento». Parece que o que faz falta é esclarecer o que se entende por sexualidade. Tenho de aprofundar o assunto... Quanto à "encarnação masculina" de Jesus, a tónica deve ser posta na encarnação. A masculinidade, ao fim e ao cabo, é questão de um cromossoma...
Caro Pensando, bem… pensando, pensando… eu associo “ultra” a uma intensificação, e não a um aumento quantitativo de modos (“poli”)… dá que pensar, pensar… Abraço e bom fim de semana…
Supra… É a tradição… Que em Deus se reúnem transcendentalmente e em espírito os diversos modos do ser numa unidade… ei ui… Deve ser assim, deve… mas a malta pode gaguejar…
Pois… A criança a brincar não tem consciência que os pais atentam tanto à sua segurança como ao sentido do seu brincar… Está sozinha a brincar… Era uma bela conversa, era… Isto e o supra…
Tem toda a razão. Aqui na “sexualidade”, jogam-se também os géneros, masculino/feminino, e que cultural e epocalmente são bem mais do que aquela diferença que todos vemos desde criança olhando para os corpos uns dos outros.
Seja como for, não pode haver algo na Criação que não reflicta Deus na sua infinita diferenciação, e que reflicta também o nada donde o “haver coisas” brota por acção divina… Essa também é a tradição… Ou, se preferir, os modos da nossa gentil tola pensar, que na sua semelhança com a mente divina mostra ou indica também a infinita dissemelhança. Isto é evidentemente cordas a mais para as minhas unhas, e por isso também acho piada a este “jogo” etimológico que lanço por vezes aqui… (Portanto, aprofunde, aprofunde… ;)
Para além disso, temos os modos de exprimir Deus e a nossa relação com Ele, e esses passam sem dúvida por analogias com as diferenciações de género.
Essa do cromossoma é curiosa… Mas Deus também se revela e nos revela... nos detalhes…
Um abraço, e bom fim de semana e aprofundamentos ;)
A "manifestação" de Deus. Não sei se foi de propósito, mas é esse o ponto central.
Mais um passinho e estamos em plena Kabbalah.
E já caindo aos trambolhões, eu diria: na escarnação, Deus faz-se Masculino, e por isso o corpo humano que o integra é o corpo de um homem-humano e não de uma mulher-humana.
engraçado, goldmundo, estava mesmo a pensar nisso, quando respondi ao victor. o Andrógino. optei pelo "poli", porque julgo que Deus, apesar de não ser classificável, terá de conter em Si todas as potencialidades do ser por Ele criado.
Pois… Há relatos genésicos (do livro do Génesis) que indicam relações sexuais entre anjos e humanos – ou melhor, entre anjos e mulheres. Aliás, nunca ouvi o termo “anjas”…
Duas coisas de imediato interpelam: o sexo não reduzido à procriação (não me lembro de nenhum ou nenhuma semi-anjo) e a questão dos géneros, que também é posta pela masculinidade da encarnação.
Não consigo bem distingui-la de supra, se bem que supra indica talvez uma elevação, um acima de; e meta um depois de (era mesmo apenas isso que significava, uma sequência “editorial” no famoso “A metafísica” do igualmente famoso Aristóteles (os tais detalhes em que Deus…), um para além de. Dito assim dá ideia que o meta não exclui aquilo de que está para além, e pode até fundá-lo ou ser o seu sentido (é o que se passa na metafísica de Aristóteles relativamente à “sua” física…)
Pois, se o ponto central não está Nele, onde haveria de estar? ;)
A questão põe-se na relação dessa humana-masculinidade-divina com o feminino. O argumento de que a masculinidade de Jesus é acidental, não essencial, estratégico cultural e epocalmente, que foi uma escolha relativamente à época e seu patriarcalismo (como se, de antemão, esse povo patriarcal não tivesse sido o escolhido, e como se esse patriarcalismo não se tivesse desenvolvido numa relação viva com Deus…) tem algo que me parece ter mais que ver com a contemporaneidade ocidental do que com enfrentar frontalmente a Revelação.
Isso não significa que se liquide a questão com uma leitura linear dos textos ou da tradição (eu até sou feminista, portanto…)
Há a questão da mariologia… Mas seja como for, ela não é Deus, e é muito discutível se gerou a Sua divindade… E eu acho que aqui desatamos todos a patinar na incompreensibilidade… ;) O que não implique que não se fale ou pense, porventura até antes pelo contrário…
Escarnação, escarnar – encarnar, escarnecer… Eh eh, são lixadas estas coisas do arco da velha…
Sim, sim. O problema é de que modos, tanto teologicamente como para a prática humana cristã aqui na terra… É que a ágape é um violento soco na mesa do eros…
Precisamente! E essa abordagem “simplista”, é o que se consegue pensar.
No entanto, voltando à vaca-cega (completamente cega!:) do cristianismo, parece-me um pouco forçado dizer-se que Jesus era andrógino (é pensável, e gnósticos e alquimistas o fizeram…)
E outro ponto se me veio agora à pinha: qual a determinação do género sexual no renascimento cristão?
Em princípio nenhuma, senão teríamos de dizer que a salvação da mulher é diferente da do homem, o que não parece de todo - e muito menos é expressa pela acção do Moço nos evangelhos... E pois, "não há homem nem mulher" do mui famoso louco em Cristo...
Quando Jesus encarnou, foi como Homem. No seu relacionamento com a raça humana, Deus sempre se identificou como Pai. Contudo, tenho para mim, e não querendo fazer doutrina, que o conceito masculino / feminino não se aplica a Deus porque é Espírito.
Depois de ter feito algumas investigações bibliotecárias, foi possível dar conta de que a relação da sexualidade com o divino é actualmente uma questão em aberto no debate teológico. Curiosamente, as maiores aportações no assunto têm vindo da teologia feminista, enquanto que os tratados clássicos de antropologia teológica parecem quase dar-lhe pouca importância. Segundo o que pude apurar, a sexualidade humana é o primeira, a mais básica base de alteridade entre humanos, essa capacidade de se estar perante um outro no qual se reconhece ao mesmo tempo semelhança e diferença. A diferença sexual torna-se, pois, fundamento da possibilidade de relação e de comunhão com o outro, tido como parceiro ou companheiro de vida. No entanto, se a dualidade sexual é a forma de ser pessoas que temos, o ser-se humano vai mais longe do que a sua concretização sexuada. De facto, no ser humano o conceito de pessoa interliga-se com o de sexualidade, mas sem ser redutível ou equiparável a este. O cristianismo fundamenta esta visão na própria figura de Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, no qual a dimensão personalista excede claramente a concretização sexuada da natureza humana. Parece ser esta uma das grandes novidades trazidas por Jesus: cada um de nós é uma pessoa íntegra, capaz se se relacionar com outros independentemente do sexo a que pertençam. Quanto à natureza de Deus, há também um dado a ter em conta: o cristianismo, ao professar um monoteísmo relacional, descreve-o, por analogia, com o binómio "Pai/Filho", preferindo-o ao binómio "Homem/Mulher", que outras religiões invocam. Será um sinal de superação, em Deus, da dualidade sexual? Pelo menos, dá-se a entender isso...
No primeiro Etimologias, adentro dum diálogo acerca dos termos relacionais de Deus (Pai, Mãe, Criador etc) o Ver para Crer referiu que em Isaías se referia a “maternidade” de Deus.
Quanto ao Espírito, deixo para “lá” a sexualidade; mas relativamente aos géneros (determinações comportamentais e de sentido masculino/feminino) a questão continua premente.
Há uma teóloga, Mary Daly, que numa obra sua (penso que no “Beyond God the father”) afirma que o “patriarquismo” é essencial, constituinte e fundacional do cristianismo (acho até que se “desconverteu”)…
Mas é evidente que o personalismo cristão supera as diferenças de género. No entanto, tudo isto é polémico e discutível, nomeadamente relativamente ao sacerdócio das mulheres e à antropologia cristã…
Quanto à antropologia clássica cristã, a pouca importância que lhe dão penso que deriva da pouca importância pública da mulher; porque o seu dever de submissão ao marido é afirmado inúmeras vezes assim como a sua menor capacidade intelectual.
Pronto, assim de imediato, que o seu comentário é para ir digerindo – então o último parágrafo…
Não percebi, Vitor, qual é a dúvida em relação à Mãe de Deus. Theotokos, e não Christotokos: Mãe de Deus e não, apenas, Mãe de Cristo, vem desde o Concílio de Éfeso aí pelo séc. V, se não me engano.
Também os "semi-anjos" estão claramente referidos na Bíblia: os "gigantes", "nephilim" ou rafaítas", que ainda foram vistos pelos primeiros exploradores da Terra Prometida. A vidente Catarina Emmerich tem um texto curiosissimo sobre uma das ultimas (?)descendentes, Semiramis. Conheces?
Agora quanto ao Andrógino: na minha (in)compreensão das coisas, tudo se passa como se Deus agisse em dois tabuleiros simultaneamente: um, o da Trindade elle-même, intacta por assim dizer e completamente revelada no Mistério da Encarnação do Filho. O outro (que foi deixado pela Igreja à especulação dos gnósticos, e que talvez prematuramente tenha sido considerado incompatível com o anterior) uma espécie de progressivo "desdobramento" ou "manifestação" de Deus na Criação, que os judeus cabalistas procuraram traduzir na sua árvore dos Sephiroth. Uma Presença sucessivamente desdobrada, que faz lembrar - salvo seja - aquelas imagens dos cogumelos atómicos em que ondas sobre ondas de fogo emergem do mesmo centro.
Aqui, seria possível pensar que, em certa etapa de manifestação, o Único se faz definitivamente dois - Masculino e Feminino Primordiais - de uma forma que teria de ser .... hum... transversal em relação à Trindade. (como se as coisas não fossem já suficientemente confusas).
Isto faz-me lembrar uma coisa do Tolkien que pode ajudar a visualisar o que quero dizer: disse ele uma vez (creio que a propósito de uma sonho que teve e que o impressionou muito) que tinha percebido que um anjo da guarda não é mais que "um pedaço finito da atenção infinita de Deus, finito porque adequado - perfeitamente adequado - à finitude que cada um de nós é." É este "desdobramento" que poderá (antes dos anjos, antes ainda deles) que poderá falar-nos do Mistério do Sexo.
Caro Víctor: perdóname. Me parece una discusión desenfocada. Dios es espíritu y, por lo mismo, no es sexuado. Es el Ser-en-sí que da vida a todos los seres.Creándolos. Estoy de acuerdo con Aquilaria cuando dice que Dios contiene en sí lo masculino y lo femenino. Pero no es ni lo uno ni lo otro.Cito a Benedcito XVI: "Dios es Dios. No es ni hombre ni mujer, sino que es Dios por encima de todo. Es la Alteridad Absoluta. Yo creo que es muy importante consignar que la fe bíblica siempre tuvo claro que Dios no es ni hombre ni mujer, sino precisamente Dios, y que el hombre y la mujer le copian. Los dos descienden de Él y las potencialidades de ambos están contenidas en Él" (Dios y el Mundo,p. 95).(Resuenan aquí las reflexiones de Aquilaria).
El sexo tiene, en los humanos, una función -inseparable- unitiva y procreativa. El sexo se degrada cuando se separan ambas funciones: ni sexo sin procreación, ni procreación sin sexo."El acto sexual ha de estar siempre abierto a la vida". La separación de ambos aspectos está dando lugar a tantas aberraciones y crímenes contra la dignidad de la persona humana.
Caro Víctor, ser hombre o mujer no es algo cultural. Se es hombre o mujer desde el mismo momento de la fecundación.Cuidado con la palabrita "GENERO". Ahí está la raíz de muchos males actuales. Yo no puedo elegir ser hombre o mujer. Me viene dado por la misma naturaleza.
Caro Víctor: " É que a ágape é um violento soco na mesa do eros…" Te recomiendo que leas despacio la primera parte de la encíclica de Benedicto XVI, Dios es amor.Verás que ágape es integrador, no ofensivo.Permíteme una breve cita."...entre el amor y lo divino existe una cierta relación: el amor promete infinidad, eternidad, una realidad más grande y completamente distinta de nuestra existencia cotidiana. Pero, al mismo tiempo, se constata que el camino para lograr esta meta no consiste simplemente en dejarse dominar por el instinto. Hace falta una purificación y maduración, que incluye también renuncia. Esto no es rechazar el EROS ni 'envenenarlo', sino sanearlo para que alcance su verdadera grandeza" (Deus charitas, n 5.)
Caro Víctor, perdona mi larga y acaso tediosa intervención. Un fortísimo abrazo lleno de Ágape.
Caríssimo Caminante: penso que a dúvida está exactemente se a diferenciação masculino-feminino ocorreu apenas numa dada etapa da evolução animal (ou da criação deles, conforme se queira) ou se reflecte uma dualidade de natureza bem mais profunda.
Esta última possibilidade foi intuída quase universalmente pelas religiões ou sistemas tradicionais. E teremos de ter o grau de cuidado de um cirurgião a operar um paciente em risco de vida se quiseremos falar, a propósito dessa dualidade, em "sexualidade". O conceito remete quase inevitavelmente para questões puramente físicas (como a ligação ao conceito de amor erótico bem demonstra). Não?
Caro Goldmundo: interesante cuestión la que planteas. Me espera la cama. He de madrugar. Prometo, porque lo mereces, intentar contestar con calma mañana. A estas horas ya no está la cabeza para estos trotes. ¿Te parece?. Un fortísimo abrazo.
Para o goldmundo: Atenção: quando se aplica a María o título de Theotokos, é precisamente e somente por ela ser a Christotokos. Por que Cristo é verdadeiro Deus e verdadeiro homem, numa única personalidade, a sua mãe humana pode ser chamada de mãe de Deus. Mas de maneira nenhuma se pretende dizer que Maria seja o fundamento da divindade de Jesus... Quanto à angelogia, sabe-se hoje que, na sua substância, ela é estranha ao núcleo primitivo da religião de Israel, tendo entrado no mundo bíblico por influência da religião persa (Zaratustra), aquando dos tempos do exílio, adquirindo mais tarde um peso significativo, sobretudo na literatura apocalíptica. Sobre a sua leitura actual, o apontamento de Tolkien é muito sugestivo...
Pois, mas eu e o concílios não nos encontramos sempre na inteligibilidade – o que não lhes retira força e interpelação de fé, porventura bem pelo contrário.
O problema da maternidade humana de Jesus e sua divindade reside na não divisão da sua consubstancialidade. Já Agostinho dizia que Maria não podia ter gerado a divindade de Jesus. Temos de convir que ser Mãe do seu Pai não resiste lá muito bem a um exame lógico (claro que a lógica humana e Deus, enfim…). Ela não é Mãe do Pai mas do Filho que é consubstancial ao Pai … Há aqui também a evidente distinção entre o Verbo enquanto mediação da Criação e o Verbo humana e historicamente encarnado em Jesus…
Quanto aos anjos, é um pouco a nota que o anonymous faz. Os mitos “titânicos” e a angeologia cristã têm uma relação problemática… Não apenas histórica, mas sobretudo conceptual.
Não conheço a vidente Catarina Emmerich. Está editado?... Quero dizer, disponível à compra?...
Quanto ao desdobramento, estou totalmente de acordo – Cristo vivo continua a agir e revelar-Se… Penso é que é preciso ter cuidado com a “mitologização” do Cristo ressuscitado, no sentido em que elidir a Sua profunda humanidade tal como é expressa nos Evangelhos é anular a Sua própria revelação. Para princípios genésicos Macho e Fêmea e por aí fora, basta-nos a religião “natural”. Não sei se me estou a explicar muito bem, mas penso que um dos jesuânicos socos na mesa da nossa naturalidade, dá-se precisamente na nossa natural tendência mitológica e filosófica. Não renega esta, como é evidente, mas renova-a dum modo que tendemos sempre a anular para voltar às formas mistéricas em que nos sentimos em casa.
Essa definição do Tolkien é maravilhosa, e certeiríssima relativamente à angeologia cristã. É evidente que se pode entender uma relação sexual reprodutora entre a adequada atenção de Deus á nossa particular finitude e um ser humano particular, mas… estás a ver onde quero chegar… enfim, como se estivesse a chegar a algum lado… ;)
Eh eh eh… Isto de pensar a Revelação lembra-me sempre o kunderiano provérbio judaico: Sempre que o homem pensa, Deus ri…
Um abraço.
PS: Irra, é mesmo brilhante a definição do Tolkien.
Antes que tudo essa de pedires perdão por algo que tenho que agradecer-te (para o caso uma comprida intervenção…), caramba… ;)
“(…) el hombre y la mujer le copian (…)” precisamente, e como tão cristalinamente pôs a Aquilária “há-de conter em si quer o masculino, quer o feminino”. Estes não se reduzem evidentemente à genitalidade. Nesse sentido Deus é sexuado, o que não é o mesmo que dizer que é homem ou mulher (excepção dada à Sua encarnação). Deus criou a partir do nada (hoje em dia é necessária esta redundância ;), e tudo na Criação o copia de algum modo, está por assim dizer, entre Ele e o nada. Esta semelhança não anula a sua fundamental e transcendental dissemelhança, como é evidente.
Quanto ao soco na mesa, estou totalmente de acordo com Bento XVI: a ágape não anula o eros mas renova-o e transfigura-o. Como penso que cada qual sabe na sua própria carne, isto é mesmo um violento soco na nossa espontaneidade. E aqui não se trata apenas de sexualidade, mas do modo como nos orientamos pelas nossas afecções estéticas e sentimentais – da qual o “amar o inimigo” é o índice do soco.
Quanto ao ser homem ou mulher biologicamente, evidentemente que não é cultural. Mas a noção de género na antropologia refere-se aos papeis e possibilidades sociais, políticas, culturais, etc que as formas societais configuraram e configuram a partir da distinção biológica. O que não se reduz à obrigatoriedade biológica.
Quanto à separação dos aspectos unitivos e procriativos da sexualidade, tenho ainda muito que meditar sobre o assunto. Obrigado pela tua clara e sintética apresentação da questão, que me ajuda bastante.
Como já falei do que em mim ecoa também dos seus comentário passo para CARO ANONYMOUS e CAROS TODOS ;)
Eu ontem andei a irritar-me com esta questão dos géneros e da sua superação em Cristo. (Pois, irritar-se é uma forma de pensar... :)
É evidente que pontos de vista como os de Mary Daly são um pouco como caricaturas. Nas suas obsessões realçam certos traços apagando outros. Mas tal como as caricaturas, isto faz com que certos aspectos surjam na sua evidência, e que de outro modo não seriam tão evidentes.
Eu aceito que a diferença biológica é de detalhe (um cromossoma...) Mas socio-culturalmente, apresentar-se homem e messias numa sociedade patriarcal, não é de somenos, e tem de Lhe ser imputado. Por outro lado, é evidente que as acções de Jesus relatadas nos evangelhos deflagram qualquer generalidade (e não apenas a sexual) dirigindo-se sempre à pessoa concreta enquanto realidade e valor, desde o questionador fariseu à mulher samaritana e por aí fora.
Acabei por ir para a cama resmungando-Lhe não será isto um dos tais paradoxos com que Ele gosta de prendear na Revelação as nossas gentis tolas tão pretensiosas de compreensão e inteligibilidade... Mas isto talvez tenha sido porque, tal como o Caminante, já estava mais para o lado do sono e do sonho do que do lado da vigília... ;)
Vítor, brevissima nota de memória sobre a Catarina Emmerich, antes de voltar às coisas em que aqui andamos:
sim, aliás está a ser reeditada neste instante em Portugal (talvez na sequência do filme de Gibson, que se inspirou no seu relato da Paixão). Antes, era improvável encontrá-la cá, havia uma edição dos anos 40 ou 50. Livrarias católicas, não sei a editora.
Era uma alemã analfabeta (ou quase) de inicio do séc. XIX. A "clássica" historia de uma criança com horror instintivo ao "pecado", uma vida de doença profunda e visões permanentes. Um alemão ligado ao movimento romântico, Clemente Brentano, foi vê-la (parece que com fortes duvidas) e acabou por ficar à sua cebeceira durante anos, transcrevendo o que ela dizia. E depois foi publicando, de modo que o que temos são relatos em segunda mão. O processo de beatificação nunca avançou, e o Vaticano é, ao que sei, particularmente cauteloso.
O conteúdo (a antiga edição tinha seis volumes) é, em primeira linha, absolutamente fascinante: uma biografia completa de Cristo desde o nascimento, tipo reportagem permanente, e coisas soltas sobre os Antigos Tempos. O relato da Paixão é para ler num dia em que não haja mais nada.
Tem, além dos pormenores sobre Jesus, duas coisas fascinantes: uma, a permanente ideia de que não há coincidências. Tipo "Cristo sentou-se numa pedra à beira do caminho. Nessa pedra tinha também descansado Adão..." (invento esta, mas há dezenas do mesmo tipo; por exemplo, o Bom Ladrão seria um bébé numa casa que acolheu a Família na fuga para o Egipto, e ambos tomaram banho juntos pela mão das suas Mães :) )
Depois, uma série de informações bem curiosas sobre Melchisedek (se leste o Senhor dos Anéis, é perfeitamente um dos Valar, ou Poderes da Terra...), os Anjos e os "filhos dos Gigantes".
Para o goldmundo: É claro que nenhuma religião é estanque e que muitos conceitos teológicos resultam de inter-influências religiosas. A questão é se são assimilados coerentemente ou se há um certo desfasamento insolúvel. No caso da angeologia, parece haver uma certa disfuncionalidade com o corpo doutrinal judaico (e cristão), porque, tal como aparece sistematizada no judaísmo bíblico tardio, se revela proveniente de um sistema dualista (dois princípios divinos que se defrontam, cada um com o seu exército celestial), a que o judaísmo procurou sempre renunciar (com maior ou menor felicidade). Já o monoteísmo surge como "resultado" de um desenvolvimento lógico e progressivo da fé israelita, sem que isso signifique que a crença monoteísta seja originalmente judaica. Quanto à Virgem Mãe, temos um conceito teológico totalmente estranho ao credo judaico. Aí o cristianismo mostra o quanto deve ao mundo helenista...
Para o vítor mácula Sobre a encarnação masculina (e não feminina) de Jesus, podem-se apontar várias razões de conveniência (social, cultural, etc) mas não de necessidade. Do ponto de vista estritamente teológico, não me parece existir nenhum argumento que afirme que a encarnação do Verbo só poderia acontecer sob a forma masculina. Se isto for tido em conta, muitas discussões deixarão de fazer sentido...
Caro Vitor, Gostava de ter esta capacidade persuasiva para, com um post de 27 letras, distribuidas em 4 palavras, provocar uma reacçäo de 45 comentários!!! :) Abraço Manel
Bem, Gold, já estou em pulgas para ler essa Catarina… Essas histórias místicas a mim aguçam-me o apetite literário e religioso. O Vaticano é sempre cauteloso com estes assuntos, até porque o misticismo tende a anular a “mediação” de terceiros, eclesiais ou outros, o que se torna evidentemente perigoso (no sentido religioso). Para além, evidentemente, duma certa tendência para o controlo que têm todas as igrejas e afins… São tão cuidadosos que na aprovação a textos místicos e inspirados e visionários, geralmente só informam que os conteúdos não vão contra a revelação e doutrina, coibindo-se de confirmar teologicamente a inspiração. Penso que os franceses e os ingleses devem ter isso editado (sim, que eu quero é os 6 volumes! ;)
Eu não liguei muito às polémicas e etc à volta do filme do Mel Gibson, e nem sabia onde tinha ele ido inspirar-se…
Agradeço – mesmo – a intromissão.
Bem, e embora a Revelação tenha ocorrido adentro de culturas e pessoas específicas, sem anular estas (o que inclui maneis e franciscas assírios, sumérios, egípcios e por aí fora, no caldo cultural em que o povo escolhido foi vivendo e co-habitando) isso não significa que o seu sentido sagrado não se entreveja e se revele nos diversos modos de vida e discurso. Mas eu não me referia bem a isso… Aliás e já agora, os mensageiros de Deus podem “ter” várias formas, consoante a particular finitude daquele ou daquela a quem vão revelar a mensagem… ;)
Isto da exegese e da teologia… é realmente uma grande confusão. Não se trata de aferir se a Revelação tem ou não elementos das culturas vigentes, envolventes ou de “dentro”, mas do seu significado e consistência conjunta. Isto são coisas que, por si, não me tiram o sono. Mas quando entram em interpelação com a minha prática de vida e com a minha fé (por exemplo, na minha relação com os outros, ou na minha ideia de Deus) já sinto necessidade de estudar, dialogar, meditar… Para geralmente chegar à socrática conclusão de que são assuntos muito difíceis de destrinçar no seu novelo, quanto mais com este fazer uma camisola que me sirva sem me picar…
Eu referia-me às problemáticas que surgem quando pensamos na relação entre seres espirituais (anjos) e, por um lado, a sua sexualidade e determinações de género sexual; e por outro, com a sua forma de relacionamento com a síntese matéria-espírito que constitui a nossa existência.
Felizmente, tenho em crer que Ele no seu juízo existencial não me irá inquirir sobre se escrevi ou compreendi tratados angeológicos… :) E no entanto, tudo isto me aguça a fé, é curioso.
O facto de não haver argumentos de necessidade mas tão só de conveniência "estratégica" mais atiça a interpelação aos olhos da fé (e talvez não tanto aos olhos exegetas e históricos). Porque, dito à papo seco, se não era necessário, qual o significado de Ele se ter decidido humanamente masculino, e quais as decorrências práticas e simbólicas.
Bem, e eu com tanta conversa, já me perdi um bocado :)
Ena bem, Gold, já pareces o varrida e racionalmente louco do Leibniz… Mas sim, algo do género, em Deus tudo é acto e sentido, realidade e mistério, embora eu não usasse o termo necessário, porque dá ideia que Deus se obriga a si mesmo através dos seus atributos (justiça, bondade etc) Enfim, nós é que somos doidos por tentar pensá-Lo (atributos de Deus?!...) Seja como for, não me parece líquido dizer-se que a masculinidade da encarnação não tem significado…
Carísimo Goldmundo: esta discusión merece un coloquio, en un atardecer silente, al calor del hogar y con un buen Oporto. O también sin él. Merecería la pena ponerse de acuerdo y encontrarse en el camino. Déjame que añada un pensamiento que puede ayudar: el hombre y la mujer no tiene sexo. El hombre y la mujer SON SERES SEXUADOS. La sexualidad es constitutivo del ser hombre o mujer. Por lo que el ejercicio del sexo implica toda la persona. Es algo sagrado. No se puede banalizar, no se puede jugar con el sexo como si nada pasase. Te remito a mi Blog: "Jugamos y pedimos". Por eso no hay más que un amor, el esponsal. Amor esponsal que supone entrega, para siempre, y fecunda. En el amor esponsal yo me entrego en totalidad, sin reservarme nada.Tener sexo es destructivo. Amar esponsalmente construye. El amor es necesariamente relacional. Te doy mi palabra que estoy aprendiendo mucho de toda esta larga discusión. Y lo agradezco. Un fortísimo abrazo.
Caro Víctor,permíteme dos pequeñas aportaciones al coloquio. Y gracias por los comentarios. Sigo pensando que Dios no es sexuado. Dios es Dios y basta. Aquí cerraría la discusión.
¡Que bien dices al exponer lo que entiendes por "soco no eros". Cierto el Ágape reconduce al Eros a su lugar de origen: "El desarrollo del amor hacia sus más altas cotas y su más íntima pureza conlleva el que ahora aspire a lo definitivo, y esto en un doble sentido: en cuanto implica exclusividad -sólo esta persona-,y en el sentido del 'para siempre'. El amor engloba la existencia entera y en todas sus dimensiones (es esponsal), incluido también el tiempo. No podría ser de otra manera, puesto que su promesa apunta a lo definitivo: el amor tiende a la eternidad. Ciertamente, el amor es 'éxtasis', pero no en el sentido de arrebato momentáneo, sino como camino permanente, como un salir del yo cerrado en sí mismo hacia su liberación en la entrega de sí y, precisamente de este modo, hacia el reencuentro consigo mismo, más aún, hacia el descubrimiento de Dios" (Benedicto XVI).Quien ama (ágape) muere a sí mismo para reencontrarse en el otro. Quien 'erotiza'se busca a sí mismo, usa del otro y se pierde. Eros y ágape han de fundirse para ser constructivos.El homb re es una unidad sustancial de alma y cuerpo. Inseparables. Te remito a mi Blog. Un fortísimo abrazo.
Caro Víctor, gracias a Dios duermo muy bien. Y esta noche también.
Permíteme insistir: el gran invento destructor del siglo XX fue la píldora anticonceptiva. Hirió de muerte al amor, lo convirtió en un juego, lo pervirtió, me atrevo a decir con lo que esto supone, lo prostituyó (en el sentido que la palabra tiene en griego). Porque el hombre es "dueño" de la fecundidad, separa amor y procreación, convierte la relación hombre-mujer en un juego banal en el que ambos pierden, perdemos todos: "Jugamos con las fuentes de la vida y hemos perdido".En el juego amoroso actual no importa la persona. Importa pasarlo bien a costa de lo que sea, incluso matando el fruto de esa relación: el hijo asesinado en el vientre de la madre. Pienso que era Virgilio quien decía:El amor vence al mundo. Y una obra de Victor Frankl ilumina y da optimismo: "El mundo gira enamorado". Caro Víctor, la victoria es de los que saben amar de verdad. Un fortísimo abrazo.
Dizer que não há mais do que um amor, o esponsal, é muito arriscado. A ser assim, a nossa relação com o divino deveria ser equacionada apenas em termos de esponsalidade. E teríamos de descrever a Trindade como Marido-Mulher-Espírito. E o facto de Jesus não ter vivido a conjugalidade humana representaria uma real menos-valia para a sua personalidade. Também aqui cabe perceber que o amor se relaciona intimamente com a sexualidade mas constitui uma realidade muito mais abrangente que esta. Não são conceitos equivalentes...
Para o vítor mácula: As discussões a que me referia são todas aquelas que desvalorizam a condição feminina ou o papel da mulher na base de argumentos (pseudo) teológicos...
Caro USUARIO ANÓNIMO: reitero mi afirmación: el amor es esponsal o no es. Esponsal no se reduce a marido-mujer. Es, efectivamente, más pleno. Abarca la totalidad de la persona. Y se manifiesta en las distintas vocacones: religioso, sacerdote, consgrado en medio del mundo, cónyuge.Siento no saber explicarlo mejor en pocas líneas. Un fortísmo abrazo.
Pienso que vale la pena leer a Catarina Emmerich. Aporta pormenores muy interesantes. Creo recordar que su porceso de beatificación se ha reabierto recientemente. Espero confirmar este dato. Me atrevo a sugerir la lectura de los escritos de Alejandrina María da Costa, reientemente beatificada por Juan Pablo II. Natural de Balazar, en el norte portugués. Falleció el 13 de mayo de 1955. Trece años, si no recuerdo mal, llevaba sin comer. Alimentada sólo por la Comuníón diaria. Vivió la Pasión del Señor y tuvo otras experiencias místicas. Recomiendo sus escritos. Aunque son para almas fuertes. Un fortísimo abrazo.
O que a malta está aqui a tentar palrar é como deriva e que consequências têm isso na relação que temos com Ele... Quanto a mim, quero eu dizer...
E evidentemente também não dá para palrar ou pensar muito senão ainda ficamos todos doidos :) - o que se calhar até tem alguma coisa a ver com a relação que temos com Ele...
Bem, a mim parece-me que a pílula é um pouco um bode expiatório para atacar a modernidade, no sentido em que antes dela já o amor era prostituível, e que os métodos anti-concepcionais não datam nem se iniciam com a pílula. A questão amorosa é sempre espiritual, sentimental, comportamental etc. Já dizia o Outro: Simplesmente pecar na intenção já é plenamente pecar. Isto é evidentemente muito discutível (quero dizer quanto à distinção entre pecado de intenção e pecado em acto, não tanto quanto à pílula…)
“Dios es Dios y basta. Aquí cerraría la discusión.” Certíssimo! ;) Mas isso lembra-me o Agostinho a constatar na sua mente e coração a impossibilidade de falar Dele, e simultaneamente a impossibilidade de falar a partir de outra “coisa”…
“Caro Víctor, la victoria es de los que saben amar de verdad.” Pois pois, caro, e por tal (o amor é o que permanece quando tudo tiver passado) é que me chamo Vítor, e por eu próprio não ser adequado a tal me chamo Mácula ;) ;) ;)
Não sei bem quais são os argumentos a que se refere da desvalorização da mulher. Os que conheço derivam mais dum concepção cultural e epocal dos géneros sexuais e sua correspondente economia, do que da teologia.
Considero que teológica e cristologicamente não é possível desvalorizar o feminino. O que é discutível é se deriva do patriarquismo judaico-cristão um fundo teológico que permita diferenciar os géneros sexuais relativamente aos carismas ordenados, algo do género. Mas eu estou tão fora do assunto, que a própria argumentação da masculinidade jesuânica para impedimento da ordenação das mulheres não me parece clara – trata-se geralmente dum argumento de simbolismo da masculinidade referente ao acto eucarístico, penso eu. Como me parece que é o todo particular de cada qual que é renovado em Cristo, para além da Sua evidente assumpção da mulher enquanto humano pleno (Maria Madalena, a mulher do poço à qual Ele revela a sua messianidade, a Sua mãe cheia de graça, enfim, tudo isto é por demais conhecido, quero dizer, está escarrapachado nos evangelhos), dá-me ideia que há aqui pontos sem nó, como se costuma dizer… Para além disso, ele disse aos seus discipúlos, Fazei isto… Não sei se exegeticamente se pode determinar que apenas se referia aos homens…
Enfim… Seja como for e como lhe disse, também penso que a masculinidade jesuânica há-de ter um significado qualquer. Se reparar, mesmo na sua pertinente argumentação de não ser Homem/Mulher a figura cósmica e religiosa, mas ser Pai/Filho anula a mulher da figura em jogo. Evidentemente que se pode dizer que só o patriarquismo levou a não dizer Mãe/Filha… Mas nesse caso, qual a relação de Deus e da Revelação com o patriarquismo, é o que deve ser esclarecido…
Não acompanhei esta discussão porque todos temos o nosso calcanhar de aquiles e se já me é avassalador falar de Deus, discuti-lo na sua sexulidade então nem que me retirasse para o deserto a comer sardaniscas e catando gafanhotos, poderia intuir algum arroubo místico que me permitisse botar faladura.
Agora, que mais uma vez se prova que o sexo é que está a dar, não duvido. Nem que tenha a seguir o nome Deus. Vou já retirar-me para o meu blogue a pensar num próximo post, onde o sexo encaixe. Talvez a vida sexual das alforrecas...também quero a minha caixa de comentários a estourar.
Carímo Víctor, sobre la píldora abriríamos un nuevo debate.Cierto que ya existían métodos anticonceptivos anteriores a la píldora. LO que quiero decir es que la píldora rompe frontalmente y a propósito el sentido del amor. Separa violentamente el aspecto unitivo y el aspecto unitivo y entrega al hombre el poder sobre la vida, intenta hacer al hombre Dios. Esto es lo que añade. Y no es una discupla para la modernidad. La mentalidad anticonceptiva es una mentalidad enti_da y antiDios
Carísimo Víctor: por un error técnico entró mi comentario incompleto. Pâso a completarlo.
Decía que la mentalidad anticonceptiva crea una mentalidad anti-vida y, en definitiva, anti-Dios. Esta es su gravedad. Cierto que siempre hubo métodos anticonceptivos, pero no con la virulencia actual. Pienso que estamos en la tentación del Paraíso: "Seréis como Dios". El hombre quiere ser dueño de la vida, "crear" la vida a su medida, ser dueño de su fecundidad, tener los hijos cuando yo quiero y como yo quiero (el camino que recorre la fecundación in vitro, el deseo o derecho del hijo a toda costa,la obtención de células embrionales...).El hijo es u n do n que viene de lo alto, no algo que se compra en el supermercado. La mentalidad anticonceptiva no soporta a Dios. Lo dice Jesús: "Bienaventurados los limpios de corazón porque ellos verán a Dios". A sensu contrario: los que se dejan llevar por la impureza no ven a Dios, no quieren ver a Dios. Y no es "un bode expiatorio para atacar la modernidad". La mentalidad anticonceptiva es una mentalidad demoníaca. El Demonio odia la vida. Por eso engaña -hoy como entonces en el Paraíso- al hombre. La vida pertenece sólo a Dios. El hombre la recibe como don. Debe acogerla. Este es el camino. POr razones de trabajo, debo ausentarme hasta el lunes día 20. Siento no podxer seguir esta interesantísma discusión. Quedan temas apenas insinuados muy interesantes. Volveremos, si Dios quiere. Un fortísimo abrazo.
Caro Zebeirâo: cierto hay Blogs para pasar el tiempo, otros inútiles llenos de vaguedades...Pero la vida es tan corta que no podemos permitirnos perder el tiempo. Estoy de acuerdo contigo que no estamos discutiendo futilidades. Estamos en serio. Y nos enriqueze a todos. Gracias por tu comentario, que es un modo discreto de aliento. Un fortísimo abrazo.
«Fale-nos sobre o sexo. - Para os que o conhecem - disse o Mestre -, o sexo é divino. - Os que o conhecem ?!... E o Mestre continuou: - O sapo senta-se ao lado das flores, sem suspeitar do mel que a abelha encontra».
rindo de anonimous. da pouca importância que o sexo tem enquanto sexo, e da muita quando se trata de gerar sexos. gerar, criar, fecundar, (parturiar, porque parir é uma palavra feia). Há diferenças nisto. Inefável e silencio. por analogia se faz muita confusão.
Sou demasiado lento a pensar para acompanhar estas conversas, ou melhor, para intervir nelas.
Continua-me a parecer que há um ponto em torno do qual se gira, e que é a peça que tornará finalmente este puzzle indecifrável...
E, Vitor, com tua licença porque estamos em tua casa, vou trazer uma coisa do C. S. Lewis já que antes tinha tarzido uma do Tolkien...
Pois o Lewis (ateu convertido ao anglicanismo) escreveu, enquanto o seu amigo Tolkien-o-Católico escrevia o Senhor dos Anéis, uma coisa fabulosamente bonita que é o Silent Planet, o "Planeta Silencioso". Outro livro delicioso (e traduzido). Na parte final, os próprios Anjos Planetários (pois que o planeta silencioso, o nosso, não era o único a ter criaturas de carne) intervêm para libertar a terra do anjo a quem a terra fora confiada, e que era precisamente... estás a ver quem.
Os homens e mulheres que fazem a parte humana da história estão numa sala, e eis que chega um dos Altos Anjos. E o narrador, que era um homem/macho, diz "diante dele, todos nós éramos... femininos".
Sempre meditei nisto. E ou isto não quer dizer nada (o que é estranho, porque o Lewis estava particularmente atento á teologia) ou o "feminino" aqui tem o sentido simbólico de passivo-receptivo. E... só esse.
Se é assim, e se isto for levado às últimas consequências (não sei se vou ser queimado por herege ou fuzilado por reaccionário), diria que:
- Deus-o-indizível e o-anterior, o criador de todas as coisas e gerador do Filho, é necessariamente masculino, pois que o masculino perfeito não é AINDA o complemento do feminino mas sim a condição da sua possibilidade´: só pode haver algo passivo-receptivo por referência a uma entidade-antes. Simbolicamente, a Lua pressupõe o Sol.
- Deus manifesta-se criando o mundo, e de uma forma misteriosa permanece além-dele e integra-o, pois que nada no mundo Lhe pode ser estranho (não há nenhum lugar de não-Deus, a não ser o insondável inferno); e a manifestação, que é sempre uma espécie de desdobramento, como que polariza o próprio Deus (não vejo nisto uma limitação dEle). E o desdobramento essencial é o do masculino-feminino. Deus-em-Acção, se assim podemos dizer, é sim o Pai que é Mãe.
- Todas as coisas criadas - incluindo os Anjos - são criadas à luz dessa polaridade essencial. Mas o masculino e o feminino não são qualidades-em-si, mas qualidades-de-relação (falta-me o vocabulário filosófico). O mesmo Anjo que nos faz a todos femininos é, ele mesmo, feminino-para Deus. (confesso que isto não anda longe da intuição chinesa do Yin-Yang)
- Em certo momento da criação (seja-se pró-darwiniano ou criacionista) surge, nos animais e no animal-homem, a impregnação dessa polaridade básica a um nível fisico (e psíquico): que isso pode não ser, também para nós, uma qualidade essencial, mas antes uma espécie de roupagem, por mais fundamente que nos forme AQUI, parece ser indicado pela frase sobre a ausência de casamento no céu, que tem de ser conjugada com a essencial solidão de Adão (antes ainda da Queda) até ser "acompanhado". Quando o corpo estiver plenamente de acordo com o Espirito, já não seríamos a metade-de-um-todo.
- O grande mistério continua a ser aqui o do casamento e o da sexualidade erótica. E aqui misturam-se em mim, infelizmente, pecado, estupidez e traumas psicológicos em doses que não sei avaliar, mas que me superam. Já tive a absoluta percepção, numa relação com uma mulher, que eu era o pólo feminino-passivo da relação. Emocionalmente, afectivamente, montes de coisas-mente, ela actuava, e eu recebia. Penso que considerações anatómicas são aqui irrelevantes. Ignoro o que ocorra em relações não-"heterosexuais" (detesto esta palavra). Se abstrairmos da componente luxúria (que me parece estar democraticamente distribuída) suspeito que esta polarização sempre se forme, mesmo que muitas vezes malgré tout.
O computador lembrou-se de baquear, e salvei o que ficou antes à pressa, nem reli. Desculpem gralhas e disparates.
E continuo num instante, só para poder ir dormir.
- Seria bonito (ou pelo menos parece-me isso) que ao lado do amor-agape que não é nada se não for dado a todos, houvesse em cada um de nós um amor-eros que não é nada se não for dado-e-recebido com um outro (e não "a um" outro). Os neo-pagãos que a si mesmos se chamam wicca chamam a certos rituais de magia erótica a "descida do deus", e de certa e terrível forma têm razão. Tudo depende de saber QUE deus se invoca, dirá um católico (dirá?).
- A "criação de vida" como fim ou justificação desta união (como sacralização de algo que sem ela seria não apenas profano mas profanador do "templo do corpo") parece-me (isto já é o sono a falar) uma carta fora do baralho. Tenho imensa pena de ver assim, mas é assim que vejo. Outra coisa é a destruição da vida, mas não queria entrar por aí.
- Com isto, fico aparentemente numa espécie de extrema-esquerda da igreja (reesclareço que estou fora dela, no sentido de fora da comunhão), o que é um pouco perturbador para o quase-integrista que seria se alguma coisa fosse, e sou tratado de incorrigível reaccionário pela maior parte dos meus amigos progressistas (politicamente falando) ou homo ou bisexuais, porque insisto numa diferença essencial entre masculino e feminino (não entre "homem" e "mulher") que a eles essencialmente escapa.
Goldmundo se pensas essas coisas todas às 3h42 da manhã...livra!
Dizes coisas muito complicadas aqui para baixo, eu só respondo à que me respondeste acima.
"Sexo barreira ao amor" Não concordo nada com isso!
Explico: No outro dia perguntavam a alguém (eu só ponho isto na boca de outra pessoa para não ser eu a dizer);) "o que era para ela o orgasmo?" a pessoa respondeu:"o Paraíso!"
Eu acho que o sexo é fundante de nós como pessoas, não foi uma prendinha que Deus nos deu, para enfeitar a nossa vida. Agora, como cada um o usa, é como a história das pérolas aos porcos. Quando falo em sexo, creio que fica claro que é em toda a sua abrangência. Que é o significado desta vossa discussão e que tão boas coisas já aqui foram ditas.
goldmundo, julgo que em algumas coisa te entendo. é feminino o reino das águas, com o mar e os seus elementos, a lua e os seus ciclos. é feminina a quase sempre dolorosa espera. e o sereno velar das sementeiras. podemos ser isso, mas circunstâncias há em que somos o lavrador ou aquele que embarca ou o que empunha a espada. tudo em nós, em cada circunstância, chama o oposto, único complemento. e julgo que é desses chamamentos e respostas que se tecem as relações. e é do emudecer que se alimenta a solidão mais profunda.
Dizer que Deus é necessariamente masculino advém de uma antropologia que poderíamos chamar pré-científica, segundo a qual era unicamente o sémen do homem que gerava a vida, sendo a mulher um mero "contentor" e "estufa" dessa nova existência. Hoje sabemos mais sobre a natureza das nossas células reprodutoras e sobre a nossa condição de mamíferos ...
Ver ou classificar a realidade das coisas segundo o binómio masculino-feminino é resvalar para um sistema dualista que é estranho à intuição judaica e cristã. O monoteísmo judaico professa um princípio uno e único da realidade. O monoteísmo cristão introduz a diferença e a relação na essência desse princípio, não de uma forma dual, mas trina. A intuição cristã reconhece que para haver relação tem de haver alteridade, mas a resposta não está na dualidade, porque uma relação desse tipo corre sempre o risco de se tornar um espelhismo, de se encerrar num circuito fechado. Por isso, faz falta um terceiro elemento, que rompa esse circuito, abrindo-o a todas as outras possibilidades de relação. O filósofo Levinas trabalhou de forma excelente este tema.
Chiii, cheguei agora mesmo. Faltava eu. Mas já não consegui ler todos os comentários. Lá voltamos nós com a história da sexualidade...e...pumba, sobem os comentários! Ah ah. Mas que posso acrescentar ao que já li. Eu vou muito pelo caminante. Deus não precisa de ser nada daquilo que nós queremos. Mas, por outro lado, se pensarmos que existimos à Sua Imagem e semelhança, podemos especular. Mas especulamos o quê, se uns são homens e outros mulheres e há ainda quem goste de homens e quem goste de mulheres!? Eu cá para mim ficava-me pelo Deus é Amor. Nesta expressão englobaria todas as formas de amor... e quis que nós fossemos amor, que nos amássemos... Será que disse algo que seja útil?! Victor, um abraço.
Pois... o que eu não sei é se toda a metafísica não é pré-científica. "pré" no sentido em que se constituiu anteriormente a ela, e "pré" no sentido em que lhe é superior. E é o superior que julga o inferior, e não o contrário.
Eu comprendo que o sémen biológico não contém em si a totalidade. Isso, à luz da ciência, demonstra a insuficiência da antropologia tradicional; em meu entender, demonstra também a inadequação da própria materialidade-que-também-somos a manter as características do Ser.
Quanto à "intuição judaica e cristã", três dúvidas: primeiro, penso que pelo menos na tradição judaica da kaballah essa dualidade está bem presente, e aliás um permanente esforço dos "místicos" judeus (se é que a palavra se aplica) foi a de apreeender o rosto ou manifestação feminina da divindade; segundo, para o caso de estarmos a falar da intuição judaica veterotestamentária apenas, diria que isso não é precoupante: também não foi percebida, por exemplo, tanto quanto sei, a essência trinitária de Deus(se calhar podemos sempre, hermenêuticamente, encontrar um ou dois fragmentozitos de salmos ou de textos proféticos que abram caminho a...); terceiro e último, o que me parece passível de ser posto em causa é a identificação (que aliás também me parece de duvidosa cientificidade) do "masculino" com o "macho". isto é, não é da observação dos machos mamíferos que deriva a compreensão da masculinidade (esse o erro lógico essencial) mas da intuição intelectual da masculinidade que vem a possibilidade de situar cada um de nós enquanto animais nessa linha.
Também me parece que nesta discrepancia entre razão científica e compreensão da verdade não há nenhum grande motivo para alarme: a razão serve a ciência mas não serve para a sapiência...
Por outro lado, se a realidade tiver, como dizes, um princípio uno - e tudo o resto derivar apenas da biologia - queria perceber o fundamento metafísico ou teológico da necessária masculinidade (?) dos sacerdotes ordenados e a interdição do matrimónio (sacramento) homosexual. Não temos regras sobre a raça branca ou semita ou a presença ou ausência de características genéticas peculiares que sejam, apenas, isso mesmo.
Oh confessionário, mas isto é sexo com qualidade :) Este Vitor espalha mel e depois tu queixas-te das moscas?!
Eh eh eh… Para um asceta, sardaniscas já seriam um banquete… Mel e gafanhotos outro… Que tal uma urtigazitas cruas?...
Quanto ao sexo que aqui interminavelmente se dialoga, inclui o das alforrecas – das amibas aos anjos… Mais um bocado e fundamos uma academia teológica :) Dequelas bem piratas, algo do género socratico-jesuânico… Eh, eh…
Eu já quase que nem me apetece fazer mais posts… Porque o fundamental parte todo daqui (Deus e a diferenciação, em que o sexo é uma das forças primordiais…)
E como estou sem vagar ou tola, deixo-te a questão de que não é líquido que possa haver unidade em Deus e diferenciação sexual (em todo o seu sentido). Por isso, seremos como anjos. E não se trata de dizer que o sexo “terrestre” é um mal, mas do fundamento transcendente e “católico” (universal em todo o seu sentido) do cristianismo. Naturalizar este… enfim, não é mesmo líquido…
Eu, por exemplo, quando leio a revista Xis, tenho sempre estertores e fervores medievalistas ;)
Quanto à relação do orgasmo com o misticismo, deixo-a para outro dia. Mas que o simultâneo esquecimento e intensificação de si que o orgasmo indicia não tem relação directa com o paraíso, isso fique já dito.
Em cheio! Temos de ter noção, nestas coisas do dizer e do pensar, que a explicitação analógica nunca é uma igualdade indiferenciada. Há imensas diferenças nisto tudo, claro.
Tu, ao menos… demasiado lento, dizes tu, e depois desenrolas um tratado para se meditar uma vida inteira… Nem quero imaginar se fosses veloz… ;)
Portanto uma impressão:
“A "criação de vida" como fim ou justificação desta união (como sacralização de algo que sem ela seria não apenas profano mas profanador do "templo do corpo") parece-me (isto já é o sono a falar) uma carta fora do baralho.” – Precisamente o meu problema, daí ter dito ao Caminante que precisava de meditar muito acerca desse assunto. Fazer depender a participação em Deus duma função ou resultado parece-me bem pior do que uma carta fora do baralho… Tenho muito mais pena que tu (enfim…:) no sentido em que a mim me parece quase uma blasfémia. Cristo desce ao amor erótico quando este serve (está aberto é a noção que sabemos ser usada pelo magistério católico-romano) a procriação e a preservação da espécie… Há algo aqui que não me é claro de todo… E só o digo porque veio o tema à baila, é realmente algo que ainda tenho muito que pensar e meditar e escutar os outros… E rezar, claro.
E penso mesmo que tudo depende de que deus se invoca, precisamente. E o que é que andamos nós a perder ou resgatar, pois claro.
Penso que não devemos confundir as categorias conceptuais com a vida. Mudar de categorias conceptuais nem sempre é mudar de categorias existenciais. Que não se queira por adequação à ciência contemporânea e à organização social e ideológica vigente chamar feminino ao conceito receptor-passivo não retira validade a este, penso eu. Se nos agarrarmos à superfície das palavras já nem sabemos ver o que ela indicam e indiciam.
Nota geral, que quanto ao resto que diz... é para meditar e pensar.
E sim, Levinas tem muito de interpelante para o que aqui se debate. O rosto do outro só me aparece enquanto tal quando não o configuro estéticamente nos meus interesses. E é um rosto terrivelmente belo que diz: não me anules. Ir ao outro e lá pousar sem remissão fechada para nós, pois...
Para o vitor: É claro que a flor suspeita da abelha. Mais: ela só existe para a abelha! E o resto do mundo ganha com iss...
P.S. Até agora, o anónimo tem sido o mesmo. Tou a ver que preciso de arranjar um nick... :)
Para o gold: A referência à Kabala que fazes diz tudo. Deus, a sê-lo, tem de ser masculino e feminino ao mesmo tempo. Como nós falamos da paternidade e maternidade de Deus numa mesma essência. Não há lugar à dissociação. Em relação a identificar o masculino com o princípio activo e o feminino com o passivo, cabem algumas cautelas. Era apenas isso que eu queria dizer ao falar de concepções pré-científicas. Em relação à ligação entre masculino e macho, é certo que não há total identificação. Mas também não há total diferença. Senão, começaremos a navegar por domínios da equivocidade. Se calhar até já o fizemos... :)
caros goldmundo, vitor,caminante (mesmo sabendo que este estará ausente por uns dias desta troca de ideias e interrogações!...), confessionário e outros: "a criação de vida como fim ou justificação desta união...etc etc", citando o goldmundo que entretanto também já foi citado pelo vitor. este assunto, também me dá muito que pensar. o que se deverá ou não se deverá passar entre um homem e uma mulher que se amam mas que têm plena consciência de que, para eles, o acto sexual não leva de todo á procriação, porque um deles, pelo menos, é irremediavelmete estéril? um dos dois (o que pode procriar) deverá procurar outro parceiro, desistindo do que não pode procriar? e o que não pode? bem, ia pôr outra pergunta mas quando a comecei a escrever vi que a sua própria formulação é um caso bicudo e dá "pano para mangas". o natural instinto de preservação da espécie a determinar a actividade sexual...ai, ai, aqui as areias são ultra-movediças. e desviantes (caramba!!!) do assunto que nos trouxe aqui, inicialmente.
Ai, pois isso do funcionalismo e das causas finais que se encadeiam... Já que estamos nestes temas, que raio, a flor não serve como elo entre Romeus e Julietas (ou Julietos, pronto, pronto), para o romântico cantar... Para nada, também, simplesmente para ser e estar... Isso no limite: para que serve haver seja o que for?...:)
E claro que navegámos pela equivocidade... Que remédio, pobres palavras e conceitos... ;)
Eu, como já disse, não estou com vagar prático nem mental para grandes esforços de pensamento e linguagem (ai, vida, vida…).
Mas para tornear alguma equivocidade (produzindo outras...:) tenho que saltar, digamos assim, das exegeses e teologias para a pastorícia ou prática ou algo assim, ou tudo ao molhe na equivocidade.
Ecoando a Aquilária volto à questão da indivisibilidade da união e da reprodução no amor erótico ou conjugal. Ora, o meu problema não está nos resultados, no sentido de querer que, como se diz em vernáculo, os esposos possam amandar umas sem se preocupar com futuros rebentos… É bem pior. Tem que ver para mim, e como indiquei, com a blasfémia de Deus poder ser obrigado ou determinado por qualquer necessidade natural ou cultural… E é bem pior, porque me dá cabo da cabeça quando por exemplo me ponho a pensar na relação da ética com Deus… Avisam-se já as hostes que isto vai ficar muito confuso…
Voltando à prática, ponho outra questão menos “sexual” e que me confunde também. Aqui põe-se uma nota ecoando o Mestre Gold: a mim, também me cabe a situação de levar na cabeça dos meus amigos modernos assim como dos integristas. Posto assim, os primeiros ficam contentes com os meus problemas com o valor da sucessão apostólica (que no limite vai até à famosa infalibilidade papal ex cathedra, que para quem sabe não tem que ver nem com todos os enunciados saídos da papal boca ou mente nem com qualquer sua independência total com o colégio episcopal…) Para logo se abespinhar quando, nos meus dias de maior comichão disposicional proponho a não eleição ou nomeação, substituídas pela pura escolha à sorte género moeda ao ar (precisamente, à Actos dos Apóstolos…) A questão do valor da sucessão é algo pastoralmente terrível – porque tem que ver com orientação sagrada da comunidade cristã. A salganhada que se me dá é na relação entre a nossa acção e a impreterível conexão com a vontade divina. Geralmente o que se avança é que tanto as escolhas como as eleições são feitas sob inspiração divina. Isto é um argumento muito forte, e tenho em crer que está mais correcto do que as minhas comichões, mas como as tenho não tenho outro remédio senão mostrar as minhas coceiras. Porque significa que, tal como está muito bem à mostra nos próprios textos bíblicos, que Deus não anula a singularidade de quem inspira. Mas, por outro lado, se a escolha ou nomeação é livre e é tomada em conjunto com pensentimentos humanos, como nós não somos Deus, há aqui um elemento de falibilidade que me parece espreitar… Ora, e se este elemento é activo e a sucessão é tomada como “exteriormente” eficaz (como alguns amigos integristas parecem pensar…) significa que obrigamos Deus a apoiar, por assim dizer, os nossos falíveis disparates, que habitam as nossas escolhas e decisões e nomeações e etc (e digo bem apoiar, e não permitir ou integrar no plano global da Criação…) Em vernáculo: mesmo quando o bispo disparata, desobedecer-lhe ou pô-lo em questão equivale a desobedecer ou por em questão o próprio Deus… Tudo isto me confunde um bocado. Porque eu como sou bastante maculado, dá-me mesmo jeito que, em termos de fundamentos, me seja claramente indicado o que Deus requer para o meu encaminhamento para Ele. Ora entre a confusão e a clareza, há evidentemente vários problemas… É evidente que remeter a bola totalmente para a bolha de Deus (ao acaso ou providência) é totalmente irracional e desresponsabilizando-nos… Bolas, isto está mesmo confuso… Mas que se lixe, também com tantos comentários, agora é com certeza permitido granelar um bocado :)
A questão toda reside no facto de poder cair-se na explícita ou inexplícita assumpção de que Deus é determinável pelo que fazemos (quando sabemos que ele paga como lhe dá na bolha e profusamente aos primeiros, aos últimos, aos do meio…) ou por uma lei natural qualquer (a da preservação da espécie). Ora, aborrecendo-me um pouco com o amigo Leibniz, eu diria que é Deus que preside à Criação e suas regras, e não as desta, naturais ou humanas, que presidem e determinam o que Deus quer ou faz ou ajuíza… Eu sou um total defensor da assumpção de que se não há milagres não há sinais que mostrem a presença divina… Quais milagres, é outra questão, nem me importo de, digamos assim, não ver nenhum e reter apenas a sua inquestionável possibilidade…
O fundo disto tudo tem que ver com a ética. Eu como sou totalmente anti-marcionista e tenho mesmo mesmo o maior respeito e apreço pelo amigo Abraão, aborreço-me agora com o amigo Kant… Deus nem é determinável na sua relação comigo pelos razoáveis bem ou mal que faço (eu sei, esta é muito perigosa…) mas pela relação pessoal que tenho a coragem e total risco de ter com Ele, avançando para a escuridão absoluta apenas pela mão da fé.
E pronto. Esta confusão é para ir sendo confundida gradualmente post a post, mas dada a profusão comentarista que aqui tivemos não me contive e pronto 2 pronto 3. Esta dos modernos e integristas é-me muito preciosa, no sentido em que a acho - enquanto divisão e separação, não enquanto dialéctica e tensão – de algum modo equivocada.
Viva o integrismo da totalidade do cristianismo e sua independência relativamente à história! Viva o modernismo da sua acção e execução em todos os presentes e em diálogo e confronto com a história!
E já que caí numa exclamação pirosa, aproveito para agradecer ás hostes sem pruridos de etiqueta, mas mesmo mesmo mesmo, tudo o que deram e disseram e vierem a dar e dizer. Há muito que não participava duma comentarada tão enriquecedora e generosa. Muito obrigado a todos, e um grande, florido e abelhudo abraço do fundo da mente e do coração.
A Maria Madalena... disse que «sim»... só pq eram bons amigos... e como era uma grande vidente... estabeleceu logo um pacto com o - por nascer - Dan Brown... tendo Deus Nosso Senhor (Ámen) por fiador!:)=
Ó Grande Servidor (não é blasfémia - ñ tou a falar com Deus)... faça favor de ofertar um fórum ao amigo Vitor, que é bom menino, andou na Catequese e até é a favor da punheta-virtual!
Engraçado que eu nunca me detive a pensar que, em termos espirituais, o ser mulher ou homem tenha alguma razão de ser ou alguma importância. Eu nunca consigo pensar em Deus no masculino ou no feminino, mas sim numa alma universal acolhedora para quem os seus filhos, da forma como se manifestam na terra não é importante mas sim a forma como se comportam e vão fazendo o seu caminho. Discutir o sexo dos anjos??? O nosso, quando passarmos a ponte para a outra margem? São discussões que não consigo encontrar o proveito... Beijinhos e bom fim de semana
2.Tente dedicar mais de um minuto ao outro na sua alteridade alterante – diabreta ou ao colo é irrelevante.
3.Se se refere ao dar-se conta por penetração sexual, é uma questão que não me interessa muito. Mas evientemente que se aperceberam da Sua masculinidade, assim como da sua feminilidade. Desenvolver esta questão exigiria comentários seus mais pertinentes e interpelantes.
4.Não li o Dan Brown. Mas este seu comentário contradiz o anterior.~
5.Porque me havia de apoquentar. As parvoíces ficam com quem as profere… Quanto aos comentários, é o seu conteúdo que interessa, enão a sua quantidade.
6. (…) Santificado seja o Teu nome Venha o Teu reino. Faça-se a Tua vontade Assim na terra como no céu. Dá-nos hoje o pão nosso de cada dia. Perdoa-nos as nossas ofensas Assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido. E não nos deixes cair em tentação Mas livra-nos do mal.
E tal O faças Nos dois únicos momentos certos Da nossa confusa existência: Agora E na hora da nossa morte.
Ámen.
7. Não sou a favor nem contra a punheta virtual. Fiz-lhe um reparo técnico acerca da sua conexão com a frustração. Não a quero pessoalmente, assim como e tal como lhe referi nessa bloguecomentada, não estou interessado em fodas colectivas. O onanismo, em todas as suas formas – sexuais, afectivas, intelectuais, etc – é algo que repudio existencialmente. Agora, é evidente que essas coisas exercem poder na nossa imediatez espontânea, toda ela feita de representações ilusórias e enganadoras. Mas há outra imediatez a adquirir e despertar, essa sim, “desonanizante”
8.Não sei a quê que se refere com a Opus Dei. Se quer indicar algum proselitismo, informo-o de que isso me é absolutamente estranho – e friso com toda a consciência o advérbio. Mas gosto bastante das homilias do Escrivã… Quanto à catequese, continuo-a… E no meu caso e na melhor das suas hipóteses, ela continuará purgatoriamente adentro da morte.
O proveito está sempre em quem o procura, e não em quem não o encontra.
Mas é evidente que estas questões são todas irrelevantes relativamente à salvação - embora isso, no seu limite, dependa de cada qual. Quero dizer, as discussões interiores que cada um tem de resolver para se renovar cristologicamente, são coisas que só Deus sabe, ou quanto muito o próprio.
Ai, ai... mais um cristão que acredita que pode encontrar um contexto de suporte coerente adentro de uma religião sempre decadente e cada vez mais moribunda! Enfim, lá terei de o levar a sério, não é, meu caro? Eu conheço o cristianismo... É avisado não se menosprezar nunca quem nos deu, dá e dará... caça! P. S. «Perdoa-nos as nossas ofensas Assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido.» Onde a vulgata mal traduz «ofensas» deveria traduzir «dívidas»... porque é esse o termo que consta no original grego.
Ai, ai... mais um anti-cristão que acredita que pode encontrar um contexto de suporte pertinente adentro de uma crítica da consistência teórica, lógica e histórica do paradoxal cristianismo! Enfim, lá terei de o levar a sério, não é, meu caro?... Seja como for, não pretendo dar-lhe caça nem convencê-lo ou desfazer as suas escolhas de vida ou pensamento ou sei lá…
Eu tenho o original grego do Novo Testamento (traduziria assim o termo pecado, e faço-o sempre subtextualmente, como “falhanço de alvo”)… Em termos existenciais, dívida ou ofensa tem que ver com contextos epocais e culturais. Eu vivo o cristianismo, e esse é o lugar apropriado ao seu sentido (como aliás toda a religião). Nesse sentido, há evidentemente uma forma de apropriação que corresponde à minha época (seja lá o que isso for…), e sobretudo à minha particular forma de o viver – adentro evidentemente duma comunhão religiosa e cultural, dum núcleo conceptual que não é tão fixo e limitado como a discursividade exige na sua redução da vida ao dizível. Não se trata evidentemente de adaptar o cristianismo ao que me dá na bolha, mas de com ele me relacionar e ao devolvê-lo à vida e ao acto na carne dos meus dias, exprimi-lo novamente num discurso que corresponda a essa vivência (e não aos textos escarrapachados, bíblicos e outros). E depois há a relação directa com o Deus vivo…
A questão da dívida corresponde para mim ao ser e vida que me é dado, e acopla-se consistentemente ao seu perdão imediato. Toma lá, e desde logo não deves nada… E por isso gosto da tradução "ofensa"... Deveríamos aqui falar da noção de pecado original, mas por ora quedo-me… Ser vivo é uma ferida...
Mais uma achega (depois de folhear a última Concilium): O binómio Esposo/Esposa, sem ser aplicado directamente às relações intra-trinitárias, tem, contudo, um peso significativo na linguagem teológica judaico-cristã. Talvez inspirando-se no seu uso por parte das antigas religiões cananeias, os profetas utilizaram tal categoria para exprimir a intimidade e a responsabilidade na relação entre Deus e o homem. Também S. Paulo se serve dela para descrever a relação de Cristo com a Igreja. Seria desenvolvida, posteriormente, pela espiritualidade monástica para descrever a união íntima da pessoa consagrada com Deus.
Penso que o conceito de «anti-cristão» se aplicaria melhor a um ateu militante... coisa que eu não sou... Não me considero, como tal, «anti-cristão», mas sim «não-cristão» e, mesmo aqui, terei que salientar que isso é uma opção... em tudo religiosa e, portanto, muito mais do que somente consciente... Parti, como todos nós, do mesmo contexto cultural... e por isso medito muitas vezes se os conceitos de «herético» e de «blasfemo» não serviriam também para me definir... Desfaço, em muito, essa possibilidade quando estou certo que a religião a que pertenço é anterior ao cristianismo... falo do culto genérico aos Celestiais (ou Anjos) que tem origem na antiga Suméria enquanto sistema (embora com manifestações dispersas, um pouco anteriores)... mas é evidente que tal religião se tem cruzado secular e ciclicamente com outras religiões, nomeadamente o cristianismo... A forma luciferária de culto aos Celestiais em que tenho Fé... mistura elementos das civilizações primordiais com elementos fundamentalmente judaicos, mas também com alguns elementos cristãos... embora o meu Lucifer em pouco ou nada estabeleça relação com o vosso... Mas, é evidente, que também se alimenta do fundo teológico que deu raíz a todas as religiões abraãnicas...
Quanto aos textos... e à ortodoxia hermenêutica que a tendenciosa tradução da vulgata veio impôr... a questão não é resolvida por uma simples e honesta afirmação de Fé... porque a Palavra determina Mundos! O vosso «Jesus» em muito pouco corresponde a Jesus... e até diria que teremos que afastar as cortinas de 2000 anos de cristianismo para perceber a Palavra e a Vida do Profeta dos cristãos... Na verdade, são apenas mil anos... da queda do Império Romano do Ocidente até à aurora do renascimento... nos primeiros 500 anos e nos últimos não existe cristianismo no sentido teologicamente consequente... basta pensarmos que nos primeiros 500 anos só os miseráveis e os escravos à volta das grandes urbes eram cristãos... permanecendo os rurais a prestar culto aos seus deuses da matriz celto-germana e as elites romanas numa reactiva «renascença pagã»... e nos últimos 500 anos basta pensarmos nas inúmeras imbecilidades teológicas de que se destacam os Dogmas criados à pressão para justificar a imbecilidade do Culto Mariano (puro bezerro de ouro pagão!)... e os inúmeros Papas loucos e criminosos! O Dogma da Imaculada Concepção de Maria (1854) é uma cretinice teológica em tudo pornográfica. Ainda mais vindo de quem veio... Pio IX, um fanático e um déspota devasso que estabeleceu a Infalibilidade Pontíficia (outra cretinice de baixa teologia!) - a isto chamo eu soberba satânica - nesse, de má memória, Primeiro Concílio do Vaticano! Quiçá tão humana raiva... por a Itália ter acabado com os Estados Pontíficios e tê-lo confinado a uma gaiola chamada Vaticano. E a palhaçada - digna de um menino de seminário recém-chegado das branhas - continuou, em 1950, com Pio XII e o Dogma da Assunção da Nossa Senhora aos Céus em Corpo e Alma... ressurreição total! JAJAJAJA!!! Outro déspota, que ao mesmo tempo proibia aos católicos serem comunistas sob pena de excomunhão! Nada há de espantar, pois, no aprisionamento em vida de uma menina camponesa e analfabeta chamada Lúcia... não fosse algum herege psiquiatra diagnosticar as visões da rapariguita de um modo bem mais humano! Etc...
Fiquemo-nos então pelo “luciferário”, que é tão confuso e ambíguo e repleto de remissões históricas e conceptuais e práticas etc como o termo “ateu” ou “cristão” e etc2.
Acontece que, como muito bem dizes, as palavras criam mundos. Há portanto uma doação e comunidade de sentido qualquer (mesmo que ilógico) nos seus diversos aspectos.
Eu sou um pouco como os leitores de banda desenhada ou coisa que o valha, ou para o caso serve. Vejo Lúcifer como uma revolta inquieta e impaciente perante Deus e a Criação (entre outras coisas, mas para o caso e o que quero dizer, serve2). Como qualquer coisa de prometaico relativo ao universo judaico-cristão.
Quando dizes que o teu Lúcifer tem pouco que ver com o “nosso”, queres dizer que não integras o Deus judaico-cristão – criador e único e etc?...
Eh pá e fico-me um pouco por aqui, dado que o teu comentário implica tanta coisa que, para além de não estar agora com muito tempo, me parece que dialogado ponto a ponto e gradualmente será mais esclarecedor e menos equivocante. Para além evidentemente de me faltarem conhecimentos históricos (por exemplo, dos sumérios apenas li a Epopeia de Gilgamesh na tradução do Pedro Tamen, e tenho uma vaga ideia da questão das runas…) Parece-me é que retirar pertinência histórico-teologica aos primeiros 500 anos do cristianismo é um pouco forçado (Agostinho, Tertuliano, Orígenes e por aí fora e dentro incluindo os evangelhos e anteriores textos judaicos… enfim…)
Apenas uma notas gerais indiciando como vivo e penso tais coisas que referes e que cobrem uma amplitude histórica e conceptual tal que precisaria de me fechar em mim e na biblioteca duma Alexandria qualquer para poder discorrer acerca delas:
- o cristianismo apropria-se das vidas pessoais e culturais na sua execução;
- Machiavel não é estranho ao catolicismo (não no sentido que o senso comum deu a “maquiavélico” ou talvez também, mas sobretudo mesmo o moço renascentista);
- o analfabetismo não é impedimento à inspiração divina, mas configura a linguagem com que essa inspiração será humanamente comunicada;
- o ponto de vista psiquiátrico não anula outros, tal como o estudo bioquímico da experiência estética não anula o seu sentido artístico;
- eu sou evidentemente um vivente apologético da conecção e mútua doação de sentidos das cartas paulinas e dos evangelhos;
- se anular a relação directa com o Deus vivo através da oração, assim como as cortinas de mediação históricas (de 2000 ou 1000 anos, tanto faz) e a comunhão na fé com contemporâneos, penso que a representação de Jesus com que fico é uma pura e pessoal e imaginativa invenção.
Que bom, um esgrimista polémico! (Bem melhor argumentar aqui, do que no Fórum da Associação Portuguesa de Satanismo - que não contém místicos, mas apenas ateus investidos de uma moral de pseudo-deuses!).
Vejamos...
O «luciferário» é um termo incomum, adentro do luciferismo. No património religioso o termo designa «aqueles que transportam o lampadário numa procissão»... Usar o termo como designativo de uma corrente teológica do luciferismo... é uma audácia que pretende traduzir não só um novo estado - contemporâneo - da mística luciferina, mas, fundamentalmente a recuperação de uma sabedoria primeva, interrompida pelos terrores medievais do demónico e pelos satanismos modernos! (Não posso falar mais abertamente mas...) Integra-se na corrente genérica de Redenção do Mundo e de Reintegração do Homem a partir da Restauração de Lucifer no seu estado Glorioso anterior à Queda... Se o meu Lucifer não é o teu... a razão é fundamente teológica: Lucifer não é, nem nunca foi, o Mal Absoluto e, com tudo o que possa ter de prometeico, não é um prometeu, um «deus travesso» e heróico... Lucifer é a Primeira das Criaturas e o Alicerce Cósmico sobre o qual assenta todo este Universo Criado. E não é o causador da Queda de Adão... mas sim Aquele Que Cai com Adão por piedade! A teologia judaico-cristã acerca disto é uma pura mentira... embora os judeus, neste aspecto, sejam um pouco mais verazes... sempre aceitaram que Quem Protege o povo judeu e Moisés no Êxodo... é Lucifer. Como é Ele a Primeira Voz que confiou a Abraão a Revelação dos seus dias futuros de Pai De Um Povo... Etc... É evidente que Há Um Só Deus... que É, Foi, Será... Mas acima (ou melhor, envolvendo-O) do Deus Único, como moldura que O define... está a Mãe Impronunciável, A Noite Primordial... Sustento Eterno de Deus... A Sua Substância só reside inteiramente Nele enquanto Vida Eterna... mas Deus tem uma Ferida de Sofrimento... Fractura da Sua Substância que Lhe permite Amar as criaturas... «A Noite devassa-O, como ao Anjo e ao Homem e a todos os Viventes e Não Viventes.»
Quanto a Agostinho... já lhe chamaram o último dos romanos e o primeiros dos cristãos! Quanto aos renascentistas... até Galileu se considerava um cristão a tentar ler, não o Livro do Verbo (as Sagradas Escrituras) mas sim o Livro da Obra (o mundo natural).
Quanto às mútliplas interpretações de uma possível manifestação do sobrenatural... a ciência dos homens não pode nem deve ser aqui desprezada... até o Direito Canónino com isto concorda! Mas mais importante é saber que uma parte considerável dos teólogos cristãos - ainda - não dão valor teológico ao Culto Mariano, sendo apenas entendido como uma forma popular e decaída de cristianismo... Basta pensares que a Igreja só aceitou as ditas «Aparições de Fátima» por arrastamento da importância que esse culto tinha ganho... e à época não encontrou nada merecedor de dignidade sobrenatural nas «Aparições».
Quanto à fidelidade aos Textos... ela é fundamental... por risco de se estar a prestar culto a uma efabulação... Existe um Cristo histórico e um Cristo das Escrituras... a diferença entre ambos é tremenda! Para não falarmos na continuada censura de todo o Texto Sagrado que colocava dificuldades à ortodoxia!
S. Paulo... brilhante! Mas um desvirtuador do cristianismo primitivo e histórico!
Tal como S. Francisco... admiro a sabedoria simples dos néscios!
«- se anular a relação directa com o Deus vivo através da oração, assim como as cortinas de mediação históricas (de 2000 ou 1000 anos, tanto faz) e a comunhão na fé com contemporâneos, penso que a representação de Jesus com que fico é uma pura e pessoal e imaginativa invenção.»... Muito pelo contrário, meu caro... aquilo com que ficarias seria a Verdade de Cristo!
Primeiro que tudo uma explicitação de como eu vivo e penso estas coisas dos planos ontológicos: os discursos e textos e afins relativos a anjos e deuses e Deus e por aí fora, são para mim indiciadores da relação humana com tais planos, mais do que uma descrição fáctica do ponto de vista e vida de tais planos. Noutro plano, sei lá, por exemplo uma formiga, também não penso nem pretendo ter acesso à sua forma de vida enquanto formiga – o que sente, o que pensa e se o faz, qual a correspondência entre o seu acontecimento em mim e o meu acontecimento nela…
E agora alguns pontos:
1. Teologicamente, o Mal Absoluto seria o nada de ser, e não evidentemente Lúcifer. Em termos de banda desenhada ;) e que é muitas vezes um bom plano discursivo para estas coisas, Lúcifer era o anjo portador da luz divina relativamente às criaturas… Eu não tenho um conhecimento muito alargado da Mishná e da Tora, mas penso que o texto bíblico não se refere a tal, nem à protecção luciferina do povo judeu… Evidentemente que estas coisas dependem muito do sentido exegético e teológico com que se lêem os textos e quais as remissões para outros textos e culturas e etc. Do ponto de vista cristão e da conversão, eu entendo o demoníaco (termo que não associo a luciferino, ou melhor, não identifico) como o que despersonaliza, aliena, faz falhar o alvo (pecar), ou seja e continuando na tradição cristã: o mundo. Este termo não se refere às coisas e actos para aí espalhados no nosso habitat, mas essencialmente a uma forma de orientação existencial que se fundamente nos poderes e prazeres imediatos (à Goethe, que é um bom banda-desenhista). Isto é, o termo “mundo” corresponde a uma forma de vida – isto do cristianismo é sempre interior… Demoníaco é algo que tem que ver com ilusões, aparências, mentiras (o pai da mentira)… A queda é a ressaca das ilusões, e por isso os fins de festa são melancólicos, não porque se perdeu algo mas porque afinal nada lá estava… Isto assim rapidamente dito. Há depois a questão da peculiar forma de temporalidade que somos, o que faz que nunca cheguemos a tempo ao decorrer da nossa vida – quando o apreendemos, já passou… O demoníaco é algo de muito banal e quotidiano… Que isso possa acontecer a anjos, seres espirituais temporais, creio-o por revelação que sim…
2. A Restauração de Lúcifer foi assumida por Orígenes, e é um ponto limite da história da teologia, e desta enquanto actividade do pensamento e da consciência. Isto na História do Cristianismo… Evidentemente – e como todos os pontos limites – esta tese, que tem que ver com a Redenção absoluta da Criação correspondente ao poder infinito de Deus, é uma tese extremamente polémica… No dizer de um padre açoriano: o Inferno (negação existencial de Deus) existe enquanto possibilidade, mas está vazio… Eu não partilho esta tese nem a contrária. Não faço a mínima… Mas gosto destes pontos teológicos que me aguçam a fé, desde que não se os dogmatize…
3. Faz sentido que Lúcifer seja a Primeira das Criaturas, visto ser o portador etc Mas não o vivo nem penso enquanto Alicerce Cósmico sobre o qual assenta toda a Criação. Isto para mim corresponde ao verbo divino, isto é Cristo. É Lúcifer que está assente em Cristo, através do qual todas as coisas foram feitas bla bla bla. É assim que ressinto, por exemplo neotestamentário, a familiaridade e cordialidade com que Jesus fala com o Diabo no deserto ou com o famoso Legião que depois manda literalmente ir com os porcos… É com o farisaísmo (forma de representação discursiva da lei que não corresponde a nenhuma forma de vida) que Ele é violento e agressivo… O que não significa evidentemente uma concordância de ser, vida e sentido, ou qualquer aceitação positiva do pecado… Eu um dia penso que farei um post acerca disto…
4. O causador da queda de Adão (o humano, isso é claro no texto hebreu, quero dizer, dizem os exegetas que eu não sei hebreu…) é a sua própria vontade… Não sei bem como é que Lúcifer andou metido ao barulho (isto é, qual afinal o sentido da serpente). Essa da piedade é curiosa…
5. “Mas acima (ou melhor, envolvendo-O) do Deus Único, como moldura que O define... está a Mãe Impronunciável, A Noite Primordial... Sustento Eterno de Deus... A Sua Substância só reside inteiramente Nele enquanto Vida Eterna... mas Deus tem uma Ferida de Sofrimento... Fractura da Sua Substância que Lhe permite Amar as criaturas... «A Noite devassa-O, como ao Anjo e ao Homem e a todos os Viventes e Não Viventes.” – Bem, aqui então certeza nenhuma me há de acompanhar até à morte… A relação entre Deus e aquilo que Ele não é, é um dos mais violentos paradoxos religiosos. Por vontade Sua, Deus devassa-se na Criação até à encarnação e à cruz, é certo cristologicamente… Mas a Mãe Impronunciável , a Noite Primordial, não é nem cronológica nem lógica nem vivencialmente anterior a Deus… Sei lá… Os teus termos, aqui, são de uma beleza avassaladora…
6. Discordo totalmente dessa leitura de S. Paulo, que considero consistente com os evangelhos. Aliás, estes não foram escritos “antes” (o documento mais antigo do Novo Testamento é precisamente uma carta de S. Paulo). O Novo Testamento é um conjunto de documentos que corresponde à constituição e vivência das primeiras comunidades cristãs… O que sabemos de Cristo é-nos dado por eles. Anulá-los e pretender assim configurar o Jesus verdadeiro e puro é um golpe de imaginação sustentado no próprio que o faz (a não ser que estejamos a falar de iluminações e visões, não sei…) Lembro-me aqui do D.H. Lawrence, do Pascoaes, do Nietzsche, e tantos outros, que pretendem exactamente que S. Paulo é um desvirtuador da pureza jesuânica…
Ufa! E chega por ora!
“Lux Máxima!” – evidentemente, mas nunca esquecendo que sou cego e coxo e mudo (que é que tu queres, sou cristão…;)
«Teologicamente, o Mal Absoluto seria o nada de ser»
Isto quer dizer, então, que a criação a partir do nada, feita por Deus, consiste na criação a partir do Mal. Assim, no principio não era o Verbo. Era o Verbo e o não-Verbo.
Eu aí, começaria pela interrogação ao embaraço das palavras, que por vezes linguisticamente produzem falácias que aparentam sentido mas… Digo começaria, porque é sem dúvida uma temática difícil… Mas o que você diz corrsponde mais ou menos a: O não-ser é… O que pode ser dito, mas não sei se pode ser pertinetemente pensado. Penso que sim, mas terá (se quiser) de explicitar-me melhor o seu pensamento… Deus não criou a partir do nada, mas do nada a partir de Si, como me parece evidente…
Deus criou a partir de Si, diz o Vítor. Isto parece-me que é uma perspectiva, de Deus, tendencionalmente emanentista, na medida em que apesar de Deus não ser o Mundo este seria uma derivação de Si mesmo, e não uma criação propriamente dita. Lembra um pouco a visão de Plotino, e não tanto a visão cristã de um Deus absolutamente transcendente, que criou algo diferente de Si. Até porque feito à sua semelhança e imagem só foi feito o Homem. Agora, parece-me que se o Mundo não é uma emanação de Deus, então este teve de o criar a partir do Nada, isto é, a partir do Mal. Mesmo que este, enquanto ausência de ser, não seja ou não possa ser pensado. Aliás, é o Vitor que começa por afirmar que o não-ser é, quando diz que «o Mal absoluto SERIA o nada de ser». Mas a razão para estes paradoxos não tem nada de transcendente. Foi a fusão entre a metafisica cristã e a metafisica grega que conduziu a tais paradoxos. O que aparenta ser paradoxal só o é porque o Deus cristão foi identificado com o Ser grego. Assim, ou Deus (Ser) é tudo (porque tudo é), ou não é tudo e por isso este «tudo» não é (porque não é Ser). Ou, como terceira possibilidade, Deus não é o Ser, mas sim um ente como tudo o resto. Mas então Deus não criou o mundo a partir de Si, mas sim a partir de outra coisa qualquer, que não o Nada. Enfim, o «mal» foi o Santo Agostinho ter-se inspirado em Plotino. A imanência plotiniana entra em conflito com a transcendência cristã.
Primeiro, a utilização do imperfeito (seria) corresponde precisamente à não liquidez do ser-nada. Ou melhor, segundo, primeiro é: Bom dia!
Bem, é evidente que a gramática dos nossos conceitos tem historicidade. Mas o que me interessa nessa tomada de consciência não é a desresponsabilização pessoal de tais concepções, retirando a água do capote para cima de Plotino ou Agostinho ou outro caramelo qualquer. A questão religiosa é: como me oriento eu próprio, aqui e agora?... E a questão é paradoxal no meu próprio pensamento, e não apenas na síntese histórica entre a transcendência do Deus judaico-cristão com o Deus neo-platónico, aristotélico, com o ser parmenidiano, etc (ou dando saltos históricos, no monismo espinosista ou na monada leibniziana, nos fluxos deleuzianos ou no seu percursor obscuro, nas figuras psicanalíticas, e em milhares doutros elementos histórico-filosóficos). Aliás, essas sínteses não são apenas acasos e ocasos históricos, mas pertinências da história do pensamento. A concatenação histórica ecoa concatenações conceptuais, e ambas ecoam em mim próprio, e a mim próprio. E isto, mesmo que eu não tenha, sob a forma do conhecimento directo e ilustrado, consciência dessas relações histórico-filosóficas e científicas. Como se sabe, não é preciso conhecimento científico da obra de Freud para orientar-se pela tese do recalcamento – anda no ar que respiramos, é essa aliás a noção viva de cultura…
Eu diria que há uma imanência transcendente de Deus na criação.
Quero dizer que entendo o “a partir do nada” da revelação como significando que fora Deus e a criação (todas as coisas visíveis e invisíveis) não existe, não há, não é, não vive, não se apresenta… coisa nenhuma. Daí que tudo o que existe tem ou participa duma qualquer imitação de Deus (não imagem, que isso é outra conversa). Mas não no sentido duma emanação, que remete para uma decorrência directa e imanente como o fumo do fogo, mas no mistério do acto da criação, na infinita dissemelhança do não-criado para o criado. Mas essa dissemelhança não significa nem desligamento nem indiferença da divindade. Deus está presente na criação como algo que se distingue absolutamente desta. A imagem que me vem agora à pinha é a evidente da presença da pessoa real do artista na sua obra…
Não digo que esta imanência transcendente é pensável ou representável; digo que o sei por fé, revelação. Se for transcendente não se relaciona pessoalmente comigo; se for imanente não difere dos modos naturais e não os supera. Ora, eu vivo-O como execução destes dois pólos, paradoxais é certo mas… bem, isto seria matéria para mais uns centos de comentários ;)
É pá, também quero um pedaço desta carne! Cá voltarei... Deus criou a partir do Mal? O Nada, o Não-Ser (não são a mesma coisa») são um mal? São o Mal??
Meus caros cristãos... acho que a vossa sorte... é que depois do cristianismo ter feito o genocídio das pessoas como eu... deixou de necessitar de uma «confraria de inquisidores»!
P. S. Deus criou a partir de Si algo diferente de Si... e só o homem é à Sua imagem e semelhança? Complicatio/explicatio? JAJAJAJA!!!
A tese (alô, Aurélio) é que o mal não é substancial, não é algo de primeiro - mas uma ferida do bem, um menos ser.
Palavras, palavras - dependem do seu uso e contexto. A que nada e não-ser te estás a referir?...
E pois, os genocídios... Assumo-os e condeno-os: culpa. Mas inquiri será sempre uma urgência da fé.;)
Quanto às semelhanças, implicam evidentemente dissemelhanças - não é uma relação de igualdade. Tudo tem uma semelhança com Deus, numa infinita dissemelhança (infinita e não total).
A imagem, é outra coisa. Aqui, trata-se do espírito (não me refiro à voláteis alminhas desencarnadas...)
Complicatio / explicatio - sempre. É uma das características da linguagem.
lá deixei comentário. não intendo praticamente nada desta comunicação; talvez tenha enviado para destino outro dentro deste blog, favor destiná-lo para "etimologia 2" se for o caso:"simplício simplório dos sonsos".
123 Comments:
Talvez assexual...
Caro Anonymous.
Assexual significaria que nada Nele reflectisse sexualidade. Ora, a Criação é sexuada... e isso não pode vir do nada ;)
Para além disso, no cristianismo, temos a Incarnação masculina de Deus...
Abraço.
ultra-sexual
Estou em crer que há uma linha teológica tradicional que vai pela assexualidade. Esta era vista em relação exclusiva com a corporeidade, de modo que não fazia sentido considerá-la relativamente às realidades espirituais. Daí a história do sexo dos anjos, ou a leitura daquela frase de Jesus: «No reino dos céus, nem eles se casam nem elas se dão em casamento».
Parece que o que faz falta é esclarecer o que se entende por sexualidade. Tenho de aprofundar o assunto...
Quanto à "encarnação masculina" de Jesus, a tónica deve ser posta na encarnação. A masculinidade, ao fim e ao cabo, é questão de um cromossoma...
Caro Pensando, bem… pensando, pensando… eu associo “ultra” a uma intensificação, e não a um aumento quantitativo de modos (“poli”)… dá que pensar, pensar… Abraço e bom fim de semana…
Alô, Jorge.
Supra… É a tradição… Que em Deus se reúnem transcendentalmente e em espírito os diversos modos do ser numa unidade… ei ui… Deve ser assim, deve… mas a malta pode gaguejar…
Pois… A criança a brincar não tem consciência que os pais atentam tanto à sua segurança como ao sentido do seu brincar… Está sozinha a brincar… Era uma bela conversa, era… Isto e o supra…
Abraços.
Caro Anonymous.
Tem toda a razão. Aqui na “sexualidade”, jogam-se também os géneros, masculino/feminino, e que cultural e epocalmente são bem mais do que aquela diferença que todos vemos desde criança olhando para os corpos uns dos outros.
Seja como for, não pode haver algo na Criação que não reflicta Deus na sua infinita diferenciação, e que reflicta também o nada donde o “haver coisas” brota por acção divina… Essa também é a tradição… Ou, se preferir, os modos da nossa gentil tola pensar, que na sua semelhança com a mente divina mostra ou indica também a infinita dissemelhança. Isto é evidentemente cordas a mais para as minhas unhas, e por isso também acho piada a este “jogo” etimológico que lanço por vezes aqui… (Portanto, aprofunde, aprofunde… ;)
Para além disso, temos os modos de exprimir Deus e a nossa relação com Ele, e esses passam sem dúvida por analogias com as diferenciações de género.
Essa do cromossoma é curiosa… Mas Deus também se revela e nos revela... nos detalhes…
Um abraço, e bom fim de semana e aprofundamentos ;)
E os anjos, e os anjos?
Nova hipótese etimológica: meta-sexual. Parece mais promissora...
Para o /me:
Quanto aos anjos, apetece-me responder como o meu avô: o que els fazem uns com os outros é lá com eles... :o)
A "manifestação" de Deus. Não sei se foi de propósito, mas é esse o ponto central.
Mais um passinho e estamos em plena Kabbalah.
E já caindo aos trambolhões, eu diria: na escarnação, Deus faz-se Masculino, e por isso o corpo humano que o integra é o corpo de um homem-humano e não de uma mulher-humana.
encarnação, claro. coisas do arco da velha, mesmo.
...totalmente sexual em todas as suas formas e confusões e variações e acompanhamentos...viva Eros!
Um abraço a todos
Morfeu
amalgama-sexual, vegetal-masculino, animal-feminino, mineral-amoroso.
poli, porque há-de conter, em si, quer o masculino, quer o feminino.
isto, numa abordagem muito simplista, que é a que eu consigo fazer.
O "Poli" quer dizer o Andrógino?
engraçado, goldmundo, estava mesmo a pensar nisso, quando respondi ao victor. o Andrógino.
optei pelo "poli", porque julgo que Deus, apesar de não ser classificável, terá de conter em Si todas as potencialidades do ser por Ele criado.
Caro /me.
Pois… Há relatos genésicos (do livro do Génesis) que indicam relações sexuais entre anjos e humanos – ou melhor, entre anjos e mulheres. Aliás, nunca ouvi o termo “anjas”…
Duas coisas de imediato interpelam: o sexo não reduzido à procriação (não me lembro de nenhum ou nenhuma semi-anjo) e a questão dos géneros, que também é posta pela masculinidade da encarnação.
Abraço.
Caro Anonymous.
Não consigo bem distingui-la de supra, se bem que supra indica talvez uma elevação, um acima de; e meta um depois de (era mesmo apenas isso que significava, uma sequência “editorial” no famoso “A metafísica” do igualmente famoso Aristóteles (os tais detalhes em que Deus…), um para além de. Dito assim dá ideia que o meta não exclui aquilo de que está para além, e pode até fundá-lo ou ser o seu sentido (é o que se passa na metafísica de Aristóteles relativamente à “sua” física…)
É promissor, é.
Um abraço.
Mestre Gold.
Pois, se o ponto central não está Nele, onde haveria de estar? ;)
A questão põe-se na relação dessa humana-masculinidade-divina com o feminino. O argumento de que a masculinidade de Jesus é acidental, não essencial, estratégico cultural e epocalmente, que foi uma escolha relativamente à época e seu patriarcalismo (como se, de antemão, esse povo patriarcal não tivesse sido o escolhido, e como se esse patriarcalismo não se tivesse desenvolvido numa relação viva com Deus…) tem algo que me parece ter mais que ver com a contemporaneidade ocidental do que com enfrentar frontalmente a Revelação.
Isso não significa que se liquide a questão com uma leitura linear dos textos ou da tradição (eu até sou feminista, portanto…)
Há a questão da mariologia… Mas seja como for, ela não é Deus, e é muito discutível se gerou a Sua divindade… E eu acho que aqui desatamos todos a patinar na incompreensibilidade… ;) O que não implique que não se fale ou pense, porventura até antes pelo contrário…
Escarnação, escarnar – encarnar, escarnecer… Eh eh, são lixadas estas coisas do arco da velha…
Abraço.
Caro Morfeu.
Sim, sim. O problema é de que modos, tanto teologicamente como para a prática humana cristã aqui na terra… É que a ágape é um violento soco na mesa do eros…
Abraço.
Caro/a blues.
Certamente por aí!
Abraço.
Cara Aquilária.
Precisamente! E essa abordagem “simplista”, é o que se consegue pensar.
No entanto, voltando à vaca-cega (completamente cega!:) do cristianismo, parece-me um pouco forçado dizer-se que Jesus era andrógino (é pensável, e gnósticos e alquimistas o fizeram…)
Enfim…
Um abraço.
E outro ponto se me veio agora à pinha: qual a determinação do género sexual no renascimento cristão?
Em princípio nenhuma, senão teríamos de dizer que a salvação da mulher é diferente da do homem, o que não parece de todo - e muito menos é expressa pela acção do Moço nos evangelhos... E pois, "não há homem nem mulher" do mui famoso louco em Cristo...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Nem supra-sexual nem poli-sexual.
Quando Jesus encarnou, foi como Homem. No seu relacionamento com a raça humana, Deus sempre se identificou como Pai.
Contudo, tenho para mim, e não querendo fazer doutrina, que o conceito masculino / feminino não se aplica a Deus porque é Espírito.
Abraços
Depois de ter feito algumas investigações bibliotecárias, foi possível dar conta de que a relação da sexualidade com o divino é actualmente uma questão em aberto no debate teológico. Curiosamente, as maiores aportações no assunto têm vindo da teologia feminista, enquanto que os tratados clássicos de antropologia teológica parecem quase dar-lhe pouca importância.
Segundo o que pude apurar, a sexualidade humana é o primeira, a mais básica base de alteridade entre humanos, essa capacidade de se estar perante um outro no qual se reconhece ao mesmo tempo semelhança e diferença. A diferença sexual torna-se, pois, fundamento da possibilidade de relação e de comunhão com o outro, tido como parceiro ou companheiro de vida.
No entanto, se a dualidade sexual é a forma de ser pessoas que temos, o ser-se humano vai mais longe do que a sua concretização sexuada. De facto, no ser humano o conceito de pessoa interliga-se com o de sexualidade, mas sem ser redutível ou equiparável a este.
O cristianismo fundamenta esta visão na própria figura de Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, no qual a dimensão personalista excede claramente a concretização sexuada da natureza humana. Parece ser esta uma das grandes novidades trazidas por Jesus: cada um de nós é uma pessoa íntegra, capaz se se relacionar com outros independentemente do sexo a que pertençam.
Quanto à natureza de Deus, há também um dado a ter em conta: o cristianismo, ao professar um monoteísmo relacional, descreve-o, por analogia, com o binómio "Pai/Filho", preferindo-o ao binómio "Homem/Mulher", que outras religiões invocam. Será um sinal de superação, em Deus, da dualidade sexual? Pelo menos, dá-se a entender isso...
Caro Joincanto.
No primeiro Etimologias, adentro dum diálogo acerca dos termos relacionais de Deus (Pai, Mãe, Criador etc) o Ver para Crer referiu que em Isaías se referia a “maternidade” de Deus.
Quanto ao Espírito, deixo para “lá” a sexualidade; mas relativamente aos géneros (determinações comportamentais e de sentido masculino/feminino) a questão continua premente.
Um abraço.
Caro Anonymous.
Há uma teóloga, Mary Daly, que numa obra sua (penso que no “Beyond God the father”) afirma que o “patriarquismo” é essencial, constituinte e fundacional do cristianismo (acho até que se “desconverteu”)…
Mas é evidente que o personalismo cristão supera as diferenças de género. No entanto, tudo isto é polémico e discutível, nomeadamente relativamente ao sacerdócio das mulheres e à antropologia cristã…
Quanto à antropologia clássica cristã, a pouca importância que lhe dão penso que deriva da pouca importância pública da mulher; porque o seu dever de submissão ao marido é afirmado inúmeras vezes assim como a sua menor capacidade intelectual.
Pronto, assim de imediato, que o seu comentário é para ir digerindo – então o último parágrafo…
Um abraço.
Não percebi, Vitor, qual é a dúvida em relação à Mãe de Deus. Theotokos, e não Christotokos: Mãe de Deus e não, apenas, Mãe de Cristo, vem desde o Concílio de Éfeso aí pelo séc. V, se não me engano.
Também os "semi-anjos" estão claramente referidos na Bíblia: os "gigantes", "nephilim" ou rafaítas", que ainda foram vistos pelos primeiros exploradores da Terra Prometida. A vidente Catarina Emmerich tem um texto curiosissimo sobre uma das ultimas (?)descendentes, Semiramis. Conheces?
Agora quanto ao Andrógino: na minha (in)compreensão das coisas, tudo se passa como se Deus agisse em dois tabuleiros simultaneamente: um, o da Trindade
elle-même, intacta por assim dizer e completamente revelada no Mistério da Encarnação do Filho. O outro (que foi deixado pela Igreja à especulação dos gnósticos, e que
talvez prematuramente tenha sido considerado incompatível com o anterior) uma espécie de progressivo "desdobramento" ou "manifestação" de Deus na Criação, que os judeus cabalistas procuraram traduzir na sua árvore dos Sephiroth. Uma Presença sucessivamente desdobrada, que faz lembrar - salvo seja - aquelas imagens dos cogumelos atómicos em que ondas sobre ondas de fogo emergem do mesmo centro.
Aqui, seria possível pensar que, em certa etapa de manifestação, o Único se faz definitivamente dois - Masculino e Feminino Primordiais - de uma forma que teria de ser .... hum... transversal em relação à Trindade. (como se as coisas não fossem já suficientemente confusas).
Isto faz-me lembrar uma coisa do Tolkien que pode ajudar a visualisar o que quero dizer: disse ele uma vez (creio que a propósito de uma sonho que teve e que o impressionou muito) que tinha percebido que um anjo da guarda não é mais que "um pedaço finito da atenção infinita de Deus, finito porque adequado - perfeitamente adequado - à finitude que cada um de nós é." É este "desdobramento" que poderá (antes dos anjos, antes ainda deles) que poderá falar-nos do Mistério do Sexo.
Abraço.
Caro Víctor: perdóname. Me parece una discusión desenfocada. Dios es espíritu y, por lo mismo, no es sexuado. Es el Ser-en-sí que da vida a todos los seres.Creándolos. Estoy de acuerdo con Aquilaria cuando dice que Dios contiene en sí lo masculino y lo femenino. Pero no es ni lo uno ni lo otro.Cito a Benedcito XVI: "Dios es Dios. No es ni hombre ni mujer, sino que es Dios por encima de todo. Es la Alteridad Absoluta. Yo creo que es muy importante consignar que la fe bíblica siempre tuvo claro que Dios no es ni hombre ni mujer, sino precisamente Dios, y que el hombre y la mujer le copian. Los dos descienden de Él y las potencialidades de ambos están contenidas en Él" (Dios y el Mundo,p. 95).(Resuenan aquí las reflexiones de Aquilaria).
El sexo tiene, en los humanos, una función -inseparable- unitiva y procreativa. El sexo se degrada cuando se separan ambas funciones: ni sexo sin procreación, ni procreación sin sexo."El acto sexual ha de estar siempre abierto a la vida". La separación de ambos aspectos está dando lugar a tantas aberraciones y crímenes contra la dignidad de la persona humana.
Caro Víctor, ser hombre o mujer no es algo cultural. Se es hombre o mujer desde el mismo momento de la fecundación.Cuidado con la palabrita "GENERO". Ahí está la raíz de muchos males actuales. Yo no puedo elegir ser hombre o mujer. Me viene dado por la misma naturaleza.
Caro Víctor: " É que a ágape é um violento soco na mesa do eros…" Te recomiendo que leas despacio la primera parte de la encíclica de Benedicto XVI, Dios es amor.Verás que ágape es integrador, no ofensivo.Permíteme una breve cita."...entre el amor y lo divino existe una cierta relación: el amor promete infinidad, eternidad, una realidad más grande y completamente distinta de nuestra existencia cotidiana. Pero, al mismo tiempo, se constata que el camino para lograr esta meta no consiste simplemente en dejarse dominar por el instinto. Hace falta una purificación y maduración, que incluye también renuncia. Esto no es rechazar el EROS ni 'envenenarlo', sino sanearlo para que alcance su verdadera grandeza" (Deus charitas, n 5.)
Caro Víctor, perdona mi larga y acaso tediosa intervención.
Un fortísimo abrazo lleno de Ágape.
Caríssimo Caminante: penso que a dúvida está exactemente se a diferenciação masculino-feminino ocorreu apenas numa dada etapa da evolução animal (ou da criação deles, conforme se queira) ou se reflecte uma dualidade de natureza bem mais profunda.
Esta última possibilidade foi intuída quase universalmente pelas religiões ou sistemas tradicionais. E teremos de ter o grau de cuidado de um cirurgião a operar um paciente em risco de vida se quiseremos falar, a propósito dessa dualidade, em "sexualidade". O conceito remete quase inevitavelmente para questões puramente físicas (como a ligação ao conceito de amor erótico bem demonstra). Não?
Víctor, dejo un presente para tí en tu e-mail.
Un fortísimo abarzo.
Caro Goldmundo: interesante cuestión la que planteas. Me espera la cama. He de madrugar. Prometo, porque lo mereces, intentar contestar con calma mañana. A estas horas ya no está la cabeza para estos trotes. ¿Te parece?.
Un fortísimo abrazo.
Para o goldmundo:
Atenção: quando se aplica a María o título de Theotokos, é precisamente e somente por ela ser a Christotokos. Por que Cristo é verdadeiro Deus e verdadeiro homem, numa única personalidade, a sua mãe humana pode ser chamada de mãe de Deus. Mas de maneira nenhuma se pretende dizer que Maria seja o fundamento da divindade de Jesus...
Quanto à angelogia, sabe-se hoje que, na sua substância, ela é estranha ao núcleo primitivo da religião de Israel, tendo entrado no mundo bíblico por influência da religião persa (Zaratustra), aquando dos tempos do exílio, adquirindo mais tarde um peso significativo, sobretudo na literatura apocalíptica. Sobre a sua leitura actual, o apontamento de Tolkien é muito sugestivo...
Mestre Gold.
Pois, mas eu e o concílios não nos encontramos sempre na inteligibilidade – o que não lhes retira força e interpelação de fé, porventura bem pelo contrário.
O problema da maternidade humana de Jesus e sua divindade reside na não divisão da sua consubstancialidade. Já Agostinho dizia que Maria não podia ter gerado a divindade de Jesus. Temos de convir que ser Mãe do seu Pai não resiste lá muito bem a um exame lógico (claro que a lógica humana e Deus, enfim…). Ela não é Mãe do Pai mas do Filho que é consubstancial ao Pai … Há aqui também a evidente distinção entre o Verbo enquanto mediação da Criação e o Verbo humana e historicamente encarnado em Jesus…
Quanto aos anjos, é um pouco a nota que o anonymous faz. Os mitos “titânicos” e a angeologia cristã têm uma relação problemática… Não apenas histórica, mas sobretudo conceptual.
Não conheço a vidente Catarina Emmerich. Está editado?... Quero dizer, disponível à compra?...
Quanto ao desdobramento, estou totalmente de acordo – Cristo vivo continua a agir e revelar-Se… Penso é que é preciso ter cuidado com a “mitologização” do Cristo ressuscitado, no sentido em que elidir a Sua profunda humanidade tal como é expressa nos Evangelhos é anular a Sua própria revelação. Para princípios genésicos Macho e Fêmea e por aí fora, basta-nos a religião “natural”. Não sei se me estou a explicar muito bem, mas penso que um dos jesuânicos socos na mesa da nossa naturalidade, dá-se precisamente na nossa natural tendência mitológica e filosófica. Não renega esta, como é evidente, mas renova-a dum modo que tendemos sempre a anular para voltar às formas mistéricas em que nos sentimos em casa.
Essa definição do Tolkien é maravilhosa, e certeiríssima relativamente à angeologia cristã. É evidente que se pode entender uma relação sexual reprodutora entre a adequada atenção de Deus á nossa particular finitude e um ser humano particular, mas… estás a ver onde quero chegar… enfim, como se estivesse a chegar a algum lado… ;)
Eh eh eh… Isto de pensar a Revelação lembra-me sempre o kunderiano provérbio judaico: Sempre que o homem pensa, Deus ri…
Um abraço.
PS: Irra, é mesmo brilhante a definição do Tolkien.
Caro Caminante.
Antes que tudo essa de pedires perdão por algo que tenho que agradecer-te (para o caso uma comprida intervenção…), caramba… ;)
“(…) el hombre y la mujer le copian (…)” precisamente, e como tão cristalinamente pôs a Aquilária “há-de conter em si quer o masculino, quer o feminino”. Estes não se reduzem evidentemente à genitalidade. Nesse sentido Deus é sexuado, o que não é o mesmo que dizer que é homem ou mulher (excepção dada à Sua encarnação). Deus criou a partir do nada (hoje em dia é necessária esta redundância ;), e tudo na Criação o copia de algum modo, está por assim dizer, entre Ele e o nada. Esta semelhança não anula a sua fundamental e transcendental dissemelhança, como é evidente.
Quanto ao soco na mesa, estou totalmente de acordo com Bento XVI: a ágape não anula o eros mas renova-o e transfigura-o. Como penso que cada qual sabe na sua própria carne, isto é mesmo um violento soco na nossa espontaneidade. E aqui não se trata apenas de sexualidade, mas do modo como nos orientamos pelas nossas afecções estéticas e sentimentais – da qual o “amar o inimigo” é o índice do soco.
Quanto ao ser homem ou mulher biologicamente, evidentemente que não é cultural. Mas a noção de género na antropologia refere-se aos papeis e possibilidades sociais, políticas, culturais, etc que as formas societais configuraram e configuram a partir da distinção biológica. O que não se reduz à obrigatoriedade biológica.
Quanto à separação dos aspectos unitivos e procriativos da sexualidade, tenho ainda muito que meditar sobre o assunto. Obrigado pela tua clara e sintética apresentação da questão, que me ajuda bastante.
Abraço agapeano!
PS: Dormiste bem? :)
Ah, isto de ir comentário a comentário... Caminante, obrigado pela prenda do mail a que irei já de seguida...
Caro Anonymous.
Como já falei do que em mim ecoa também dos seus comentário passo para CARO ANONYMOUS e CAROS TODOS ;)
Eu ontem andei a irritar-me com esta questão dos géneros e da sua superação em Cristo. (Pois, irritar-se é uma forma de pensar... :)
É evidente que pontos de vista como os de
Mary Daly são um pouco como caricaturas. Nas suas obsessões realçam certos traços apagando outros. Mas tal como as caricaturas, isto faz com que certos aspectos surjam na sua evidência, e que de outro modo não seriam tão evidentes.
Eu aceito que a diferença biológica é de detalhe (um cromossoma...) Mas socio-culturalmente, apresentar-se homem e messias numa sociedade patriarcal, não é de somenos, e tem de Lhe ser imputado. Por outro lado, é evidente que as acções de Jesus relatadas nos evangelhos deflagram qualquer generalidade (e não apenas a sexual) dirigindo-se sempre à pessoa concreta enquanto realidade e valor, desde o questionador fariseu à mulher samaritana e por aí fora.
Acabei por ir para a cama resmungando-Lhe não será isto um dos tais paradoxos com que Ele gosta de prendear na Revelação as nossas gentis tolas tão pretensiosas de compreensão e inteligibilidade... Mas isto talvez tenha sido porque, tal como o Caminante, já estava mais para o lado do sono e do sonho do que do lado da vigília... ;)
Abraços.
Caro Gold, como refere o Caminante, essa da diferenciação sexual e o momento da evolução ou desdobrar da criação é realmente muito rica...
Vítor, brevissima nota de memória sobre a Catarina Emmerich, antes de voltar às coisas em que aqui andamos:
sim, aliás está a ser reeditada neste instante em Portugal (talvez na sequência do filme de Gibson, que se inspirou no seu relato da Paixão). Antes, era improvável encontrá-la cá, havia uma edição dos anos 40 ou 50. Livrarias católicas, não sei a editora.
Era uma alemã analfabeta (ou quase) de inicio do séc. XIX. A "clássica" historia de uma criança com horror instintivo ao "pecado", uma vida de doença profunda e visões permanentes. Um alemão ligado ao movimento romântico, Clemente Brentano, foi vê-la (parece que com fortes duvidas) e acabou por ficar à sua cebeceira durante anos, transcrevendo o que ela dizia. E depois foi publicando, de modo que o que temos são relatos em segunda mão. O processo de beatificação nunca avançou, e o Vaticano é, ao que sei, particularmente cauteloso.
O conteúdo (a antiga edição tinha seis volumes) é, em primeira linha, absolutamente fascinante: uma biografia completa de Cristo desde o nascimento, tipo reportagem permanente, e coisas soltas sobre os Antigos Tempos. O relato da Paixão é para ler num dia em que não haja mais nada.
Tem, além dos pormenores sobre Jesus, duas coisas fascinantes: uma, a permanente ideia de que não há coincidências. Tipo "Cristo sentou-se numa pedra à beira do caminho. Nessa pedra tinha também descansado Adão..." (invento esta, mas há dezenas do mesmo tipo; por exemplo, o Bom Ladrão seria um bébé numa casa que acolheu a Família na fuga para o Egipto, e ambos tomaram banho juntos pela mão das suas Mães :) )
Depois, uma série de informações bem curiosas sobre Melchisedek (se leste o Senhor dos Anéis, é perfeitamente um dos Valar, ou Poderes da Terra...), os Anjos e os "filhos dos Gigantes".
É um vicio.
Desculpa lá a intromissão aqui neste sítio.
Devo só dizer que o argumento "os anjos são assirios" também pode ser aplicado ao Monoteismo, à Virgem Mãe, etc.
Para o goldmundo:
É claro que nenhuma religião é estanque e que muitos conceitos teológicos resultam de inter-influências religiosas. A questão é se são assimilados coerentemente ou se há um certo desfasamento insolúvel. No caso da angeologia, parece haver uma certa disfuncionalidade com o corpo doutrinal judaico (e cristão), porque, tal como aparece sistematizada no judaísmo bíblico tardio, se revela proveniente de um sistema dualista (dois princípios divinos que se defrontam, cada um com o seu exército celestial), a que o judaísmo procurou sempre renunciar (com maior ou menor felicidade). Já o monoteísmo surge como "resultado" de um desenvolvimento lógico e progressivo da fé israelita, sem que isso signifique que a crença monoteísta seja originalmente judaica.
Quanto à Virgem Mãe, temos um conceito teológico totalmente estranho ao credo judaico. Aí o cristianismo mostra o quanto deve ao mundo helenista...
Para o vítor mácula
Sobre a encarnação masculina (e não feminina) de Jesus, podem-se apontar várias razões de conveniência (social, cultural, etc) mas não de necessidade. Do ponto de vista estritamente teológico, não me parece existir nenhum argumento que afirme que a encarnação do Verbo só poderia acontecer sob a forma masculina. Se isto for tido em conta, muitas discussões deixarão de fazer sentido...
Caro Vitor,
Gostava de ter esta capacidade persuasiva para, com um post de 27 letras, distribuidas em 4 palavras, provocar uma reacçäo de 45 comentários!!! :)
Abraço
Manel
Bem, Gold, já estou em pulgas para ler essa Catarina… Essas histórias místicas a mim aguçam-me o apetite literário e religioso. O Vaticano é sempre cauteloso com estes assuntos, até porque o misticismo tende a anular a “mediação” de terceiros, eclesiais ou outros, o que se torna evidentemente perigoso (no sentido religioso). Para além, evidentemente, duma certa tendência para o controlo que têm todas as igrejas e afins… São tão cuidadosos que na aprovação a textos místicos e inspirados e visionários, geralmente só informam que os conteúdos não vão contra a revelação e doutrina, coibindo-se de confirmar teologicamente a inspiração. Penso que os franceses e os ingleses devem ter isso editado (sim, que eu quero é os 6 volumes! ;)
Eu não liguei muito às polémicas e etc à volta do filme do Mel Gibson, e nem sabia onde tinha ele ido inspirar-se…
Agradeço – mesmo – a intromissão.
Bem, e embora a Revelação tenha ocorrido adentro de culturas e pessoas específicas, sem anular estas (o que inclui maneis e franciscas assírios, sumérios, egípcios e por aí fora, no caldo cultural em que o povo escolhido foi vivendo e co-habitando) isso não significa que o seu sentido sagrado não se entreveja e se revele nos diversos modos de vida e discurso. Mas eu não me referia bem a isso… Aliás e já agora, os mensageiros de Deus podem “ter” várias formas, consoante a particular finitude daquele ou daquela a quem vão revelar a mensagem… ;)
Isto da exegese e da teologia… é realmente uma grande confusão. Não se trata de aferir se a Revelação tem ou não elementos das culturas vigentes, envolventes ou de “dentro”, mas do seu significado e consistência conjunta. Isto são coisas que, por si, não me tiram o sono. Mas quando entram em interpelação com a minha prática de vida e com a minha fé (por exemplo, na minha relação com os outros, ou na minha ideia de Deus) já sinto necessidade de estudar, dialogar, meditar… Para geralmente chegar à socrática conclusão de que são assuntos muito difíceis de destrinçar no seu novelo, quanto mais com este fazer uma camisola que me sirva sem me picar…
Eu referia-me às problemáticas que surgem quando pensamos na relação entre seres espirituais (anjos) e, por um lado, a sua sexualidade e determinações de género sexual; e por outro, com a sua forma de relacionamento com a síntese matéria-espírito que constitui a nossa existência.
Felizmente, tenho em crer que Ele no seu juízo existencial não me irá inquirir sobre se escrevi ou compreendi tratados angeológicos… :) E no entanto, tudo isto me aguça a fé, é curioso.
Caro Anonymous.
O facto de não haver argumentos de necessidade mas tão só de conveniência "estratégica" mais atiça a interpelação aos olhos da fé (e talvez não tanto aos olhos exegetas e históricos). Porque, dito à papo seco, se não era necessário, qual o significado de Ele se ter decidido humanamente masculino, e quais as decorrências práticas e simbólicas.
Bem, e eu com tanta conversa, já me perdi um bocado :)
A que discussões se refere?
Lá vou eu pôr achas na minha fogueira :(
Em Deus, não existe o possível. Apenas o necessário.
Caro Manuel (ou isso agora é Manel?:)
Tu não te ponhas com números, senão ainda vêm para aí simbolismos aritméticos e geométricos e nunca mais saímos daqui...
Abraço.
Ena bem, Gold, já pareces o varrida e racionalmente louco do Leibniz… Mas sim, algo do género, em Deus tudo é acto e sentido, realidade e mistério, embora eu não usasse o termo necessário, porque dá ideia que Deus se obriga a si mesmo através dos seus atributos (justiça, bondade etc) Enfim, nós é que somos doidos por tentar pensá-Lo (atributos de Deus?!...) Seja como for, não me parece líquido dizer-se que a masculinidade da encarnação não tem significado…
A sexualidade deriva Dele. Deus-na-sexualidade.
Carísimo Goldmundo: esta discusión merece un coloquio, en un atardecer silente, al calor del hogar y con un buen Oporto. O también sin él. Merecería la pena ponerse de acuerdo y encontrarse en el camino.
Déjame que añada un pensamiento que puede ayudar: el hombre y la mujer no tiene sexo. El hombre y la mujer SON SERES SEXUADOS. La sexualidad es constitutivo del ser hombre o mujer. Por lo que el ejercicio del sexo implica toda la persona. Es algo sagrado. No se puede banalizar, no se puede jugar con el sexo como si nada pasase. Te remito a mi Blog: "Jugamos y pedimos".
Por eso no hay más que un amor, el esponsal. Amor esponsal que supone entrega, para siempre, y fecunda. En el amor esponsal yo me entrego en totalidad, sin reservarme nada.Tener sexo es destructivo. Amar esponsalmente construye. El amor es necesariamente relacional.
Te doy mi palabra que estoy aprendiendo mucho de toda esta larga discusión. Y lo agradezco.
Un fortísimo abrazo.
Caro Víctor,permíteme dos pequeñas aportaciones al coloquio. Y gracias por los comentarios.
Sigo pensando que Dios no es sexuado. Dios es Dios y basta. Aquí cerraría la discusión.
¡Que bien dices al exponer lo que entiendes por "soco no eros". Cierto el Ágape reconduce al Eros a su lugar de origen: "El desarrollo del amor hacia sus más altas cotas y su más íntima pureza conlleva el que ahora aspire a lo definitivo, y esto en un doble sentido: en cuanto implica exclusividad -sólo esta persona-,y en el sentido del 'para siempre'. El amor engloba la existencia entera y en todas sus dimensiones (es esponsal), incluido también el tiempo. No podría ser de otra manera, puesto que su promesa apunta a lo definitivo: el amor tiende a la eternidad. Ciertamente, el amor es 'éxtasis', pero no en el sentido de arrebato momentáneo, sino como camino permanente, como un salir del yo cerrado en sí mismo hacia su liberación en la entrega de sí y, precisamente de este modo, hacia el reencuentro consigo mismo, más aún, hacia el descubrimiento de Dios" (Benedicto XVI).Quien ama (ágape) muere a sí mismo para reencontrarse en el otro. Quien 'erotiza'se busca a sí mismo, usa del otro y se pierde.
Eros y ágape han de fundirse para ser constructivos.El homb re es una unidad sustancial de alma y cuerpo. Inseparables.
Te remito a mi Blog.
Un fortísimo abrazo.
Caro Víctor, gracias a Dios duermo muy bien. Y esta noche también.
Permíteme insistir: el gran invento destructor del siglo XX fue la píldora anticonceptiva. Hirió de muerte al amor, lo convirtió en un juego, lo pervirtió, me atrevo a decir con lo que esto supone, lo prostituyó (en el sentido que la palabra tiene en griego). Porque el hombre es "dueño" de la fecundidad, separa amor y procreación, convierte la relación hombre-mujer en un juego banal en el que ambos pierden, perdemos todos: "Jugamos con las fuentes de la vida y hemos perdido".En el juego amoroso actual no importa la persona. Importa pasarlo bien a costa de lo que sea, incluso matando el fruto de esa relación: el hijo asesinado en el vientre de la madre.
Pienso que era Virgilio quien decía:El amor vence al mundo. Y una obra de Victor Frankl ilumina y da optimismo: "El mundo gira enamorado".
Caro Víctor, la victoria es de los que saben amar de verdad.
Un fortísimo abrazo.
Para o caminante:
Dizer que não há mais do que um amor, o esponsal, é muito arriscado. A ser assim, a nossa relação com o divino deveria ser equacionada apenas em termos de esponsalidade. E teríamos de descrever a Trindade como Marido-Mulher-Espírito. E o facto de Jesus não ter vivido a conjugalidade humana representaria uma real menos-valia para a sua personalidade. Também aqui cabe perceber que o amor se relaciona intimamente com a sexualidade mas constitui uma realidade muito mais abrangente que esta. Não são conceitos equivalentes...
Para o vítor mácula:
As discussões a que me referia são todas aquelas que desvalorizam a condição feminina ou o papel da mulher na base de argumentos (pseudo) teológicos...
Caro USUARIO ANÓNIMO: reitero mi afirmación: el amor es esponsal o no es. Esponsal no se reduce a marido-mujer. Es, efectivamente, más pleno. Abarca la totalidad de la persona. Y se manifiesta en las distintas vocacones: religioso, sacerdote, consgrado en medio del mundo, cónyuge.Siento no saber explicarlo mejor en pocas líneas.
Un fortísmo abrazo.
Pienso que vale la pena leer a Catarina Emmerich. Aporta pormenores muy interesantes. Creo recordar que su porceso de beatificación se ha reabierto recientemente. Espero confirmar este dato.
Me atrevo a sugerir la lectura de los escritos de Alejandrina María da Costa, reientemente beatificada por Juan Pablo II. Natural de Balazar, en el norte portugués. Falleció el 13 de mayo de 1955. Trece años, si no recuerdo mal, llevaba sin comer. Alimentada sólo por la Comuníón diaria. Vivió la Pasión del Señor y tuvo otras experiencias místicas. Recomiendo sus escritos. Aunque son para almas fuertes.
Un fortísimo abrazo.
Cara Catarina.
Evidentemente!
O que a malta está aqui a tentar palrar é como deriva e que consequências têm isso na relação que temos com Ele... Quanto a mim, quero eu dizer...
E evidentemente também não dá para palrar ou pensar muito senão ainda ficamos todos doidos :) - o que se calhar até tem alguma coisa a ver com a relação que temos com Ele...
Abraço.
então lá vai uma pequena acha para a fogueira do goldmundo: em Deus, o essencial.
Caro Caminante.
Bem, a mim parece-me que a pílula é um pouco um bode expiatório para atacar a modernidade, no sentido em que antes dela já o amor era prostituível, e que os métodos anti-concepcionais não datam nem se iniciam com a pílula. A questão amorosa é sempre espiritual, sentimental, comportamental etc. Já dizia o Outro: Simplesmente pecar na intenção já é plenamente pecar. Isto é evidentemente muito discutível (quero dizer quanto à distinção entre pecado de intenção e pecado em acto, não tanto quanto à pílula…)
“Dios es Dios y basta. Aquí cerraría la discusión.” Certíssimo! ;) Mas isso lembra-me o Agostinho a constatar na sua mente e coração a impossibilidade de falar Dele, e simultaneamente a impossibilidade de falar a partir de outra “coisa”…
“Caro Víctor, la victoria es de los que saben amar de verdad.” Pois pois, caro, e por tal (o amor é o que permanece quando tudo tiver passado) é que me chamo Vítor, e por eu próprio não ser adequado a tal me chamo Mácula ;) ;) ;)
Abraço forte eh eh.
Caro Anonymous.
Não sei bem quais são os argumentos a que se refere da desvalorização da mulher. Os que conheço derivam mais dum concepção cultural e epocal dos géneros sexuais e sua correspondente economia, do que da teologia.
Considero que teológica e cristologicamente não é possível desvalorizar o feminino. O que é discutível é se deriva do patriarquismo judaico-cristão um fundo teológico que permita diferenciar os géneros sexuais relativamente aos carismas ordenados, algo do género. Mas eu estou tão fora do assunto, que a própria argumentação da masculinidade jesuânica para impedimento da ordenação das mulheres não me parece clara – trata-se geralmente dum argumento de simbolismo da masculinidade referente ao acto eucarístico, penso eu. Como me parece que é o todo particular de cada qual que é renovado em Cristo, para além da Sua evidente assumpção da mulher enquanto humano pleno (Maria Madalena, a mulher do poço à qual Ele revela a sua messianidade, a Sua mãe cheia de graça, enfim, tudo isto é por demais conhecido, quero dizer, está escarrapachado nos evangelhos), dá-me ideia que há aqui pontos sem nó, como se costuma dizer… Para além disso, ele disse aos seus discipúlos, Fazei isto… Não sei se exegeticamente se pode determinar que apenas se referia aos homens…
Enfim… Seja como for e como lhe disse, também penso que a masculinidade jesuânica há-de ter um significado qualquer. Se reparar, mesmo na sua pertinente argumentação de não ser Homem/Mulher a figura cósmica e religiosa, mas ser Pai/Filho anula a mulher da figura em jogo. Evidentemente que se pode dizer que só o patriarquismo levou a não dizer Mãe/Filha… Mas nesse caso, qual a relação de Deus e da Revelação com o patriarquismo, é o que deve ser esclarecido…
Enfim 2… e um abraço.
aquilária, bem... essa acha parece-me que vai é para a fogueira de todos... eh eh... o essencial é assim... ;)
Não sei. É muita areia para a minha camionete, como se dizia há uns anos.
Quem sabe está calado...
Cara Em contra-corrente.
Olha, para a minha furgonete também ;)
E claro que o silêncio dos místicos diz muito mais acertadamente o que há a dizer do que todas as palavras...
Um abraço.
Querido Zé Beirão.
Quem são esses que tal dizem?... Deve dizer-se-lhes que nada é fútil enquanto não cai sob um olhar fútil...
Abraço forte.
Meu querido Vítor e etc's
Não acompanhei esta discussão porque todos temos o nosso calcanhar de aquiles e se já me é avassalador falar de Deus, discuti-lo na sua sexulidade então nem que me retirasse para o deserto a comer sardaniscas e catando gafanhotos, poderia intuir algum arroubo místico que me permitisse botar faladura.
Agora, que mais uma vez se prova que o sexo é que está a dar, não duvido. Nem que tenha a seguir o nome Deus.
Vou já retirar-me para o meu blogue a pensar num próximo post, onde o sexo encaixe. Talvez a vida sexual das alforrecas...também quero a minha caixa de comentários a estourar.
eu diria, mc, que a razão disso é que o sexo é a grande barreira entre nós e o amor.
e já volto aqui, com mais tempo.
Carímo Víctor, sobre la píldora abriríamos un nuevo debate.Cierto que ya existían métodos anticonceptivos anteriores a la píldora. LO que quiero decir es que la píldora rompe frontalmente y a propósito el sentido del amor. Separa violentamente el aspecto unitivo y el aspecto unitivo y entrega al hombre el poder sobre la vida, intenta hacer al hombre Dios. Esto es lo que añade. Y no es una discupla para la modernidad.
La mentalidad anticonceptiva es una mentalidad enti_da y antiDios
Carísimo Víctor: por un error técnico entró mi comentario incompleto. Pâso a completarlo.
Decía que la mentalidad anticonceptiva crea una mentalidad anti-vida y, en definitiva, anti-Dios. Esta es su gravedad. Cierto que siempre hubo métodos anticonceptivos, pero no con la virulencia actual. Pienso que estamos en la tentación del Paraíso: "Seréis como Dios". El hombre quiere ser dueño de la vida, "crear" la vida a su medida, ser dueño de su fecundidad, tener los hijos cuando yo quiero y como yo quiero (el camino que recorre la fecundación in vitro, el deseo o derecho del hijo a toda costa,la obtención de células embrionales...).El hijo es u n do n que viene de lo alto, no algo que se compra en el supermercado. La mentalidad anticonceptiva no soporta a Dios. Lo dice Jesús: "Bienaventurados los limpios de corazón porque ellos verán a Dios". A sensu contrario: los que se dejan llevar por la impureza no ven a Dios, no quieren ver a Dios.
Y no es "un bode expiatorio para atacar la modernidad". La mentalidad anticonceptiva es una mentalidad demoníaca. El Demonio odia la vida. Por eso engaña -hoy como entonces en el Paraíso- al hombre. La vida pertenece sólo a Dios. El hombre la recibe como don. Debe acogerla. Este es el camino.
POr razones de trabajo, debo ausentarme hasta el lunes día 20. Siento no podxer seguir esta interesantísma discusión. Quedan temas apenas insinuados muy interesantes. Volveremos, si Dios quiere.
Un fortísimo abrazo.
Un fortísmo abrazo.
Caro Zebeirâo: cierto hay Blogs para pasar el tiempo, otros inútiles llenos de vaguedades...Pero la vida es tan corta que no podemos permitirnos perder el tiempo. Estoy de acuerdo contigo que no estamos discutiendo futilidades. Estamos en serio. Y nos enriqueze a todos. Gracias por tu comentario, que es un modo discreto de aliento.
Un fortísimo abrazo.
«Fale-nos sobre o sexo.
- Para os que o conhecem - disse o Mestre -, o sexo é divino.
- Os que o conhecem ?!...
E o Mestre continuou:
- O sapo senta-se ao lado das flores, sem suspeitar do mel que a abelha encontra».
rindo de anonimous. da pouca importância que o sexo tem enquanto sexo, e da muita quando se trata de gerar sexos. gerar, criar, fecundar, (parturiar, porque parir é uma palavra feia). Há diferenças nisto. Inefável e silencio. por analogia se faz muita confusão.
Sou demasiado lento a pensar para acompanhar estas conversas, ou melhor, para intervir nelas.
Continua-me a parecer que há um ponto em torno do qual se gira, e que é a peça que tornará finalmente este puzzle indecifrável...
E, Vitor, com tua licença porque estamos em tua casa, vou trazer uma coisa do C. S. Lewis já que antes tinha tarzido uma do Tolkien...
Pois o Lewis (ateu convertido ao anglicanismo) escreveu, enquanto o seu amigo Tolkien-o-Católico escrevia o Senhor dos Anéis, uma coisa fabulosamente bonita que é o Silent Planet, o "Planeta Silencioso". Outro livro delicioso (e traduzido). Na parte final, os próprios Anjos Planetários (pois que o planeta silencioso, o nosso, não era o único a ter criaturas de carne) intervêm para libertar a terra do anjo a quem a terra fora confiada, e que era precisamente... estás a ver quem.
Os homens e mulheres que fazem a parte humana da história estão numa sala, e eis que chega um dos Altos Anjos. E o narrador, que era um homem/macho, diz "diante dele, todos nós éramos... femininos".
Sempre meditei nisto. E ou isto não quer dizer nada (o que é estranho, porque o Lewis estava
particularmente atento á teologia) ou o "feminino" aqui tem o sentido simbólico de passivo-receptivo. E... só esse.
Se é assim, e se isto for levado às últimas consequências (não sei se vou ser queimado por herege ou fuzilado por reaccionário), diria que:
- Deus-o-indizível e o-anterior, o criador de todas as coisas e gerador do Filho, é necessariamente masculino, pois que o masculino perfeito não é AINDA o complemento do feminino mas sim a condição da sua possibilidade´: só pode haver algo passivo-receptivo por referência a uma entidade-antes. Simbolicamente, a Lua pressupõe o Sol.
- Deus manifesta-se criando o mundo, e de uma forma misteriosa permanece além-dele e integra-o, pois que nada no mundo Lhe pode ser estranho (não há nenhum lugar de não-Deus, a não ser o insondável inferno); e a manifestação, que é sempre uma espécie de desdobramento, como que polariza o próprio Deus (não vejo nisto uma limitação dEle). E o desdobramento essencial é o do masculino-feminino. Deus-em-Acção, se assim podemos dizer, é sim o Pai que é Mãe.
- Todas as coisas criadas - incluindo os Anjos - são criadas à luz dessa polaridade essencial. Mas o masculino e o feminino não são qualidades-em-si, mas qualidades-de-relação (falta-me o vocabulário filosófico). O mesmo Anjo que nos faz a todos femininos é, ele mesmo, feminino-para Deus. (confesso que isto não anda longe da intuição chinesa do Yin-Yang)
- Em certo momento da criação (seja-se pró-darwiniano ou criacionista) surge, nos animais e no animal-homem, a impregnação dessa polaridade básica a um nível fisico (e psíquico): que isso pode não ser, também para nós, uma qualidade essencial, mas antes uma espécie de roupagem, por mais fundamente que nos forme AQUI, parece ser indicado pela frase sobre a ausência de casamento no céu, que tem de ser conjugada com a essencial solidão de Adão (antes ainda da Queda) até ser "acompanhado". Quando o corpo estiver plenamente de acordo com o Espirito, já não seríamos a metade-de-um-todo.
- O grande mistério continua a ser aqui o do casamento e o da sexualidade erótica. E aqui misturam-se em mim, infelizmente, pecado, estupidez e traumas psicológicos em doses que não sei avaliar, mas que me superam. Já tive a absoluta percepção, numa relação com uma mulher, que eu era o pólo feminino-passivo da relação. Emocionalmente, afectivamente, montes de coisas-mente, ela actuava, e eu recebia. Penso que considerações anatómicas são aqui irrelevantes. Ignoro o que ocorra em relações não-"heterosexuais" (detesto esta palavra). Se abstrairmos da componente luxúria (que me parece estar democraticamente distribuída) suspeito que esta polarização sempre se forme, mesmo que muitas vezes malgré tout.
-
O computador lembrou-se de baquear, e salvei o que ficou antes à pressa, nem reli. Desculpem gralhas e disparates.
E continuo num instante, só para poder ir dormir.
- Seria bonito (ou pelo menos parece-me isso) que ao lado do amor-agape que não é nada se não for dado a todos, houvesse em cada um de nós um amor-eros que não é nada se não for dado-e-recebido com um outro (e não "a um" outro). Os neo-pagãos que a si mesmos se chamam wicca chamam a certos rituais de magia erótica a "descida do deus", e de certa e terrível forma têm razão. Tudo depende de saber QUE deus se invoca, dirá um católico (dirá?).
- A "criação de vida" como fim ou justificação desta união (como sacralização de algo que sem ela seria não apenas profano mas profanador do "templo do corpo") parece-me (isto já é o sono a falar) uma carta fora do baralho. Tenho imensa pena de ver assim, mas é assim que vejo. Outra coisa é a destruição da vida, mas não queria entrar por aí.
- Com isto, fico aparentemente numa espécie de extrema-esquerda da igreja (reesclareço que estou fora dela, no sentido de fora da comunhão), o que é um pouco perturbador para o quase-integrista que seria se alguma coisa fosse, e sou tratado de incorrigível reaccionário pela maior parte dos meus amigos progressistas (politicamente falando) ou homo ou bisexuais, porque insisto numa diferença essencial entre masculino e feminino (não entre "homem" e "mulher") que a eles essencialmente escapa.
Detesto pensar.
Goldmundo
se pensas essas coisas todas às 3h42 da manhã...livra!
Dizes coisas muito complicadas aqui para baixo, eu só respondo à que me respondeste acima.
"Sexo barreira ao amor" Não concordo nada com isso!
Explico:
No outro dia perguntavam a alguém (eu só ponho isto na boca de outra pessoa para não ser eu a dizer);)
"o que era para ela o orgasmo?" a pessoa respondeu:"o Paraíso!"
Eu acho que o sexo é fundante de nós como pessoas, não foi uma prendinha que Deus nos deu, para enfeitar a nossa vida. Agora, como cada um o usa, é como a história das pérolas aos porcos. Quando falo em sexo, creio que fica claro que é em toda a sua abrangência. Que é o significado desta vossa discussão e que tão boas coisas já aqui foram ditas.
goldmundo, julgo que em algumas coisa te entendo.
é feminino o reino das águas, com o mar e os seus elementos, a lua e os seus ciclos. é feminina a quase sempre dolorosa espera. e o sereno velar das sementeiras. podemos ser isso, mas circunstâncias há em que somos o lavrador ou aquele que embarca ou o que empunha a espada. tudo em nós, em cada circunstância, chama o oposto, único complemento.
e julgo que é desses chamamentos e respostas que se tecem as relações.
e é do emudecer que se alimenta a solidão mais profunda.
sim, aquilária, é profundamente isso. O cálice e a espada, ou a taça e o punhal, ou o Graal e a Lança, ou a virgem e o unicórnio.
como pudemos abandonar isto aos gnósticos e aos pagãos? que preço agora para o resgatar?
Caro goldmundo:
Dizer que Deus é necessariamente masculino advém de uma antropologia que poderíamos chamar pré-científica, segundo a qual era unicamente o sémen do homem que gerava a vida, sendo a mulher um mero "contentor" e "estufa" dessa nova existência. Hoje sabemos mais sobre a natureza das nossas células reprodutoras e sobre a nossa condição de mamíferos ...
Ver ou classificar a realidade das coisas segundo o binómio masculino-feminino é resvalar para um sistema dualista que é estranho à intuição judaica e cristã.
O monoteísmo judaico professa um princípio uno e único da realidade. O monoteísmo cristão introduz a diferença e a relação na essência desse princípio, não de uma forma dual, mas trina.
A intuição cristã reconhece que para haver relação tem de haver alteridade, mas a resposta não está na dualidade, porque uma relação desse tipo corre sempre o risco de se tornar um espelhismo, de se encerrar num circuito fechado. Por isso, faz falta um terceiro elemento, que rompa esse circuito, abrindo-o a todas as outras possibilidades de relação. O filósofo Levinas trabalhou de forma excelente este tema.
Chiii, cheguei agora mesmo. Faltava eu. Mas já não consegui ler todos os comentários. Lá voltamos nós com a história da sexualidade...e...pumba, sobem os comentários! Ah ah.
Mas que posso acrescentar ao que já li. Eu vou muito pelo caminante. Deus não precisa de ser nada daquilo que nós queremos. Mas, por outro lado, se pensarmos que existimos à Sua Imagem e semelhança, podemos especular. Mas especulamos o quê, se uns são homens e outros mulheres e há ainda quem goste de homens e quem goste de mulheres!? Eu cá para mim ficava-me pelo Deus é Amor. Nesta expressão englobaria todas as formas de amor... e quis que nós fossemos amor, que nos amássemos... Será que disse algo que seja útil?! Victor, um abraço.
Caro anónimo, obrigado pelo comentário!
Pois... o que eu não sei é se toda a metafísica não é pré-científica. "pré" no sentido em que se constituiu anteriormente a ela, e "pré" no sentido em que lhe é superior. E é o superior que julga o inferior, e não o contrário.
Eu comprendo que o sémen biológico não contém em si a totalidade. Isso, à luz da ciência, demonstra a insuficiência da antropologia tradicional; em meu entender, demonstra também a inadequação da própria materialidade-que-também-somos a manter as características do Ser.
Quanto à "intuição judaica e cristã", três dúvidas: primeiro, penso que pelo menos na tradição judaica da kaballah essa dualidade está bem presente, e aliás um permanente esforço dos "místicos" judeus (se é que a palavra se aplica) foi a de apreeender o rosto ou manifestação feminina da divindade; segundo, para o caso de estarmos a falar da intuição judaica veterotestamentária apenas, diria que isso não é precoupante: também não foi percebida, por exemplo, tanto quanto sei, a essência trinitária de Deus(se calhar podemos sempre, hermenêuticamente, encontrar um ou dois fragmentozitos de salmos ou de textos proféticos que abram caminho a...); terceiro e último, o que me parece passível de ser posto em causa é a identificação (que aliás também me parece de duvidosa cientificidade) do "masculino" com o "macho". isto é, não é da observação dos machos mamíferos que deriva a compreensão da masculinidade (esse o erro lógico essencial) mas da intuição intelectual da masculinidade que vem a possibilidade de situar cada um de nós enquanto animais nessa linha.
Também me parece que nesta discrepancia entre razão científica e compreensão da verdade não há nenhum grande motivo para alarme: a razão serve a ciência mas não serve para a sapiência...
Por outro lado, se a realidade tiver, como dizes, um princípio uno - e tudo o resto derivar apenas da biologia - queria perceber o fundamento metafísico ou teológico da necessária masculinidade (?) dos sacerdotes ordenados e a interdição do matrimónio (sacramento) homosexual. Não temos regras sobre a raça branca ou semita ou a presença ou ausência de características genéticas peculiares que sejam, apenas, isso mesmo.
Oh confessionário, mas isto é sexo com qualidade :) Este Vitor espalha mel e depois tu queixas-te das moscas?!
Querida MC.
Eh eh eh… Para um asceta, sardaniscas já seriam um banquete… Mel e gafanhotos outro… Que tal uma urtigazitas cruas?...
Quanto ao sexo que aqui interminavelmente se dialoga, inclui o das alforrecas – das amibas aos anjos… Mais um bocado e fundamos uma academia teológica :) Dequelas bem piratas, algo do género socratico-jesuânico… Eh, eh…
Eu já quase que nem me apetece fazer mais posts… Porque o fundamental parte todo daqui (Deus e a diferenciação, em que o sexo é uma das forças primordiais…)
E como estou sem vagar ou tola, deixo-te a questão de que não é líquido que possa haver unidade em Deus e diferenciação sexual (em todo o seu sentido). Por isso, seremos como anjos. E não se trata de dizer que o sexo “terrestre” é um mal, mas do fundamento transcendente e “católico” (universal em todo o seu sentido) do cristianismo. Naturalizar este… enfim, não é mesmo líquido…
Eu, por exemplo, quando leio a revista Xis, tenho sempre estertores e fervores medievalistas ;)
Quanto à relação do orgasmo com o misticismo, deixo-a para outro dia. Mas que o simultâneo esquecimento e intensificação de si que o orgasmo indicia não tem relação directa com o paraíso, isso fique já dito.
Beijos.
Caro Caminante.
Si, volveremos, volveremos si Dios quiere ;)
Abraço.
Caro anonymous (quantos haverá? este será "o mesmo"?...:)
E a flor, suspeita da abelha?... Essa é que é a questão ;)
Abraço.
Caro/a blues.
Em cheio! Temos de ter noção, nestas coisas do dizer e do pensar, que a explicitação analógica nunca é uma igualdade indiferenciada. Há imensas diferenças nisto tudo, claro.
Abraço.
Mestre Gold.
Tu, ao menos… demasiado lento, dizes tu, e depois desenrolas um tratado para se meditar uma vida inteira… Nem quero imaginar se fosses veloz… ;)
Portanto uma impressão:
“A "criação de vida" como fim ou justificação desta união (como sacralização de algo que sem ela seria não apenas profano mas profanador do "templo do corpo") parece-me (isto já é o sono a falar) uma carta fora do baralho.” – Precisamente o meu problema, daí ter dito ao Caminante que precisava de meditar muito acerca desse assunto. Fazer depender a participação em Deus duma função ou resultado parece-me bem pior do que uma carta fora do baralho… Tenho muito mais pena que tu (enfim…:) no sentido em que a mim me parece quase uma blasfémia. Cristo desce ao amor erótico quando este serve (está aberto é a noção que sabemos ser usada pelo magistério católico-romano) a procriação e a preservação da espécie… Há algo aqui que não me é claro de todo… E só o digo porque veio o tema à baila, é realmente algo que ainda tenho muito que pensar e meditar e escutar os outros… E rezar, claro.
E penso mesmo que tudo depende de que deus se invoca, precisamente. E o que é que andamos nós a perder ou resgatar, pois claro.
Abração.
Querida Aquilária.
Desejo que sejas loucamente poetizada ;)
Abraço forte.
Caro confessionário.
Mas, caramba, há "amores" demoníacos, não?...
Eh eh, é o que dá chegar a meio do debate... Leva-se logo com uma derrapagem ;)
Abraço forte.
Caro Anonymous das abelhas ou...;)
Penso que não devemos confundir as categorias conceptuais com a vida. Mudar de categorias conceptuais nem sempre é mudar de categorias existenciais. Que não se queira por adequação à ciência contemporânea e à organização social e ideológica vigente chamar feminino ao conceito receptor-passivo não retira validade a este, penso eu. Se nos agarrarmos à superfície das palavras já nem sabemos ver o que ela indicam e indiciam.
Nota geral, que quanto ao resto que diz... é para meditar e pensar.
E sim, Levinas tem muito de interpelante para o que aqui se debate. O rosto do outro só me aparece enquanto tal quando não o configuro estéticamente nos meus interesses. E é um rosto terrivelmente belo que diz: não me anules. Ir ao outro e lá pousar sem remissão fechada para nós, pois...
Ufa!
Um grande abraço.
Para o vitor:
É claro que a flor suspeita da abelha. Mais: ela só existe para a abelha! E o resto do mundo ganha com iss...
P.S. Até agora, o anónimo tem sido o mesmo. Tou a ver que preciso de arranjar um nick... :)
Para o gold:
A referência à Kabala que fazes diz tudo. Deus, a sê-lo, tem de ser masculino e feminino ao mesmo tempo. Como nós falamos da paternidade e maternidade de Deus numa mesma essência. Não há lugar à dissociação.
Em relação a identificar o masculino com o princípio activo e o feminino com o passivo, cabem algumas cautelas. Era apenas isso que eu queria dizer ao falar de concepções pré-científicas.
Em relação à ligação entre masculino e macho, é certo que não há total identificação. Mas também não há total diferença. Senão, começaremos a navegar por domínios da equivocidade. Se calhar até já o fizemos... :)
caros goldmundo, vitor,caminante (mesmo sabendo que este estará ausente por uns dias desta troca de ideias e interrogações!...), confessionário e outros:
"a criação de vida como fim ou justificação desta união...etc etc", citando o goldmundo que entretanto também já foi citado pelo vitor. este assunto, também me dá muito que pensar.
o que se deverá ou não se deverá passar entre um homem e uma mulher que se amam mas que têm plena consciência de que, para eles, o acto sexual não leva de todo á procriação, porque um deles, pelo menos, é irremediavelmete estéril? um dos dois (o que pode procriar) deverá procurar outro parceiro, desistindo do que não pode procriar? e o que não pode?
bem, ia pôr outra pergunta mas quando a comecei a escrever vi que a sua própria formulação é um caso bicudo e dá "pano para mangas". o natural instinto de preservação da espécie a determinar a actividade sexual...ai, ai, aqui as areias são ultra-movediças. e desviantes (caramba!!!) do assunto que nos trouxe aqui, inicialmente.
bem, um abraço a todos.
Caro Anonymous.
Ai, pois isso do funcionalismo e das causas finais que se encadeiam... Já que estamos nestes temas, que raio, a flor não serve como elo entre Romeus e Julietas (ou Julietos, pronto, pronto), para o romântico cantar... Para nada, também, simplesmente para ser e estar... Isso no limite: para que serve haver seja o que for?...:)
E claro que navegámos pela equivocidade... Que remédio, pobres palavras e conceitos... ;)
Abraço.
Caros.
Eu, como já disse, não estou com vagar prático nem mental para grandes esforços de pensamento e linguagem (ai, vida, vida…).
Mas para tornear alguma equivocidade (produzindo outras...:) tenho que saltar, digamos assim, das exegeses e teologias para a pastorícia ou prática ou algo assim, ou tudo ao molhe na equivocidade.
Ecoando a Aquilária volto à questão da indivisibilidade da união e da reprodução no amor erótico ou conjugal. Ora, o meu problema não está nos resultados, no sentido de querer que, como se diz em vernáculo, os esposos possam amandar umas sem se preocupar com futuros rebentos… É bem pior. Tem que ver para mim, e como indiquei, com a blasfémia de Deus poder ser obrigado ou determinado por qualquer necessidade natural ou cultural… E é bem pior, porque me dá cabo da cabeça quando por exemplo me ponho a pensar na relação da ética com Deus… Avisam-se já as hostes que isto vai ficar muito confuso…
Voltando à prática, ponho outra questão menos “sexual” e que me confunde também. Aqui põe-se uma nota ecoando o Mestre Gold: a mim, também me cabe a situação de levar na cabeça dos meus amigos modernos assim como dos integristas. Posto assim, os primeiros ficam contentes com os meus problemas com o valor da sucessão apostólica (que no limite vai até à famosa infalibilidade papal ex cathedra, que para quem sabe não tem que ver nem com todos os enunciados saídos da papal boca ou mente nem com qualquer sua independência total com o colégio episcopal…) Para logo se abespinhar quando, nos meus dias de maior comichão disposicional proponho a não eleição ou nomeação, substituídas pela pura escolha à sorte género moeda ao ar (precisamente, à Actos dos Apóstolos…) A questão do valor da sucessão é algo pastoralmente terrível – porque tem que ver com orientação sagrada da comunidade cristã. A salganhada que se me dá é na relação entre a nossa acção e a impreterível conexão com a vontade divina. Geralmente o que se avança é que tanto as escolhas como as eleições são feitas sob inspiração divina. Isto é um argumento muito forte, e tenho em crer que está mais correcto do que as minhas comichões, mas como as tenho não tenho outro remédio senão mostrar as minhas coceiras. Porque significa que, tal como está muito bem à mostra nos próprios textos bíblicos, que Deus não anula a singularidade de quem inspira. Mas, por outro lado, se a escolha ou nomeação é livre e é tomada em conjunto com pensentimentos humanos, como nós não somos Deus, há aqui um elemento de falibilidade que me parece espreitar… Ora, e se este elemento é activo e a sucessão é tomada como “exteriormente” eficaz (como alguns amigos integristas parecem pensar…) significa que obrigamos Deus a apoiar, por assim dizer, os nossos falíveis disparates, que habitam as nossas escolhas e decisões e nomeações e etc (e digo bem apoiar, e não permitir ou integrar no plano global da Criação…) Em vernáculo: mesmo quando o bispo disparata, desobedecer-lhe ou pô-lo em questão equivale a desobedecer ou por em questão o próprio Deus… Tudo isto me confunde um bocado. Porque eu como sou bastante maculado, dá-me mesmo jeito que, em termos de fundamentos, me seja claramente indicado o que Deus requer para o meu encaminhamento para Ele. Ora entre a confusão e a clareza, há evidentemente vários problemas… É evidente que remeter a bola totalmente para a bolha de Deus (ao acaso ou providência) é totalmente irracional e desresponsabilizando-nos… Bolas, isto está mesmo confuso… Mas que se lixe, também com tantos comentários, agora é com certeza permitido granelar um bocado :)
A questão toda reside no facto de poder cair-se na explícita ou inexplícita assumpção de que Deus é determinável pelo que fazemos (quando sabemos que ele paga como lhe dá na bolha e profusamente aos primeiros, aos últimos, aos do meio…) ou por uma lei natural qualquer (a da preservação da espécie). Ora, aborrecendo-me um pouco com o amigo Leibniz, eu diria que é Deus que preside à Criação e suas regras, e não as desta, naturais ou humanas, que presidem e determinam o que Deus quer ou faz ou ajuíza… Eu sou um total defensor da assumpção de que se não há milagres não há sinais que mostrem a presença divina… Quais milagres, é outra questão, nem me importo de, digamos assim, não ver nenhum e reter apenas a sua inquestionável possibilidade…
O fundo disto tudo tem que ver com a ética. Eu como sou totalmente anti-marcionista e tenho mesmo mesmo o maior respeito e apreço pelo amigo Abraão, aborreço-me agora com o amigo Kant… Deus nem é determinável na sua relação comigo pelos razoáveis bem ou mal que faço (eu sei, esta é muito perigosa…) mas pela relação pessoal que tenho a coragem e total risco de ter com Ele, avançando para a escuridão absoluta apenas pela mão da fé.
E pronto.
Esta confusão é para ir sendo confundida gradualmente post a post, mas dada a profusão comentarista que aqui tivemos não me contive e pronto 2 pronto 3.
Esta dos modernos e integristas é-me muito preciosa, no sentido em que a acho - enquanto divisão e separação, não enquanto dialéctica e tensão – de algum modo equivocada.
Viva o integrismo da totalidade do cristianismo e sua independência relativamente à história!
Viva o modernismo da sua acção e execução em todos os presentes e em diálogo e confronto com a história!
E já que caí numa exclamação pirosa, aproveito para agradecer ás hostes sem pruridos de etiqueta, mas mesmo mesmo mesmo, tudo o que deram e disseram e vierem a dar e dizer. Há muito que não participava duma comentarada tão enriquecedora e generosa. Muito obrigado a todos, e um grande, florido e abelhudo abraço do fundo da mente e do coração.
O meu contentamento para os auto-de-fé futuros... é poder ver tanto cristão nas fogueiras ao lado!!
Pá, prometo vir cá ler esta entrada com atenção... Tenho agora aqui uma diabreta ao colo que não me deixa concentrar nestas merdas intelectuais!!:)=
Ou melhor... digo... Merdas sexuais metafísicas! JAJAJAJA!!!
(Pá, dscp lá a pergunta: Jesus era masculino?? As suas contemporâneas não deram por nada!! JAJAJAJA!!!).
A Maria Madalena... disse que «sim»... só pq eram bons amigos... e como era uma grande vidente... estabeleceu logo um pacto com o - por nascer - Dan Brown... tendo Deus Nosso Senhor (Ámen) por fiador!:)=
(Não te apoquentes... isto sou eu a querer q isto fique com 100 comentários!!)
«Pai Nosso que Estais no Céu... (continuem vocês que tão mais bem treinados que eu!)»...
(Só mais um:)= )
Ó Grande Servidor (não é blasfémia - ñ tou a falar com Deus)... faça favor de ofertar um fórum ao amigo Vitor, que é bom menino, andou na Catequese e até é a favor da punheta-virtual!
E não te aborreças... isto tá tão comprido q ninguém vai ler os meus comments! (Excepto tu, claro... Que não te falte o vigor e o labor Opus Dei!).
Bem, como diz o outro: «Só se atiram pedras às árvores que têm fruto»... ;)
Engraçado que eu nunca me detive a pensar que, em termos espirituais, o ser mulher ou homem tenha alguma razão de ser ou alguma importância. Eu nunca consigo pensar em Deus no masculino ou no feminino, mas sim numa alma universal acolhedora para quem os seus filhos, da forma como se manifestam na terra não é importante mas sim a forma como se comportam e vão fazendo o seu caminho.
Discutir o sexo dos anjos??? O nosso, quando passarmos a ponte para a outra margem?
São discussões que não consigo encontrar o proveito...
Beijinhos e bom fim de semana
Dad... lê o Antigo Testamento... os Anjos têm, de facto, sexo... Hubris, hubris!:)
Caro Lord Of Erewhon
1.Que esses autos de fé sejam fogueiras de amor.
2.Tente dedicar mais de um minuto ao outro na sua alteridade alterante – diabreta ou ao colo é irrelevante.
3.Se se refere ao dar-se conta por penetração sexual, é uma questão que não me interessa muito. Mas evientemente que se aperceberam da Sua masculinidade, assim como da sua feminilidade. Desenvolver esta questão exigiria comentários seus mais pertinentes e interpelantes.
4.Não li o Dan Brown. Mas este seu comentário contradiz o anterior.~
5.Porque me havia de apoquentar. As parvoíces ficam com quem as profere… Quanto aos comentários, é o seu conteúdo que interessa, enão a sua quantidade.
6. (…) Santificado seja o Teu nome
Venha o Teu reino.
Faça-se a Tua vontade
Assim na terra como no céu.
Dá-nos hoje o pão nosso de cada dia.
Perdoa-nos as nossas ofensas
Assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido.
E não nos deixes cair em tentação
Mas livra-nos do mal.
E tal O faças
Nos dois únicos momentos certos
Da nossa confusa existência:
Agora
E na hora da nossa morte.
Ámen.
7. Não sou a favor nem contra a punheta virtual. Fiz-lhe um reparo técnico acerca da sua conexão com a frustração. Não a quero pessoalmente, assim como e tal como lhe referi nessa bloguecomentada, não estou interessado em fodas colectivas. O onanismo, em todas as suas formas – sexuais, afectivas, intelectuais, etc – é algo que repudio existencialmente. Agora, é evidente que essas coisas exercem poder na nossa imediatez espontânea, toda ela feita de representações ilusórias e enganadoras. Mas há outra imediatez a adquirir e despertar, essa sim, “desonanizante”
8.Não sei a quê que se refere com a Opus Dei. Se quer indicar algum proselitismo, informo-o de que isso me é absolutamente estranho – e friso com toda a consciência o advérbio.
Mas gosto bastante das homilias do Escrivã…
Quanto à catequese, continuo-a… E no meu caso e na melhor das suas hipóteses, ela continuará purgatoriamente adentro da morte.
Caro Anonymous.
E no entanto, aqui na terra e nos corações fendidos, as árvore ferem os frutos. Mas essas feridas, se cuidadas, dão... frutos ;)
Abraço.
Caro/a Dad.
O proveito está sempre em quem o procura, e não em quem não o encontra.
Mas é evidente que estas questões são todas irrelevantes relativamente à salvação - embora isso, no seu limite, dependa de cada qual. Quero dizer, as discussões interiores que cada um tem de resolver para se renovar cristologicamente, são coisas que só Deus sabe, ou quanto muito o próprio.
Um abraço.
Ai, ai... mais um cristão que acredita que pode encontrar um contexto de suporte
coerente adentro de uma religião sempre decadente e cada vez mais moribunda!
Enfim, lá terei de o levar a sério, não é, meu caro? Eu conheço o cristianismo... É avisado não se menosprezar nunca quem nos deu, dá e dará... caça!
P. S. «Perdoa-nos as nossas ofensas
Assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido.»
Onde a vulgata mal traduz «ofensas» deveria traduzir «dívidas»... porque é esse o termo que consta no original grego.
Ai, ai... mais um anti-cristão que acredita que pode encontrar um contexto de suporte
pertinente adentro de uma crítica da consistência teórica, lógica e histórica do paradoxal cristianismo!
Enfim, lá terei de o levar a sério, não é, meu caro?... Seja como for, não pretendo dar-lhe caça nem convencê-lo ou desfazer as suas escolhas de vida ou pensamento ou sei lá…
Eu tenho o original grego do Novo Testamento (traduziria assim o termo pecado, e faço-o sempre subtextualmente, como “falhanço de alvo”)… Em termos existenciais, dívida ou ofensa tem que ver com contextos epocais e culturais. Eu vivo o cristianismo, e esse é o lugar apropriado ao seu sentido (como aliás toda a religião). Nesse sentido, há evidentemente uma forma de apropriação que corresponde à minha época (seja lá o que isso for…), e sobretudo à minha particular forma de o viver – adentro evidentemente duma comunhão religiosa e cultural, dum núcleo conceptual que não é tão fixo e limitado como a discursividade exige na sua redução da vida ao dizível. Não se trata evidentemente de adaptar o cristianismo ao que me dá na bolha, mas de com ele me relacionar e ao devolvê-lo à vida e ao acto na carne dos meus dias, exprimi-lo novamente num discurso que corresponda a essa vivência (e não aos textos escarrapachados, bíblicos e outros). E depois há a relação directa com o Deus vivo…
A questão da dívida corresponde para mim ao ser e vida que me é dado, e acopla-se consistentemente ao seu perdão imediato. Toma lá, e desde logo não deves nada… E por isso gosto da tradução "ofensa"... Deveríamos aqui falar da noção de pecado original, mas por ora quedo-me… Ser vivo é uma ferida...
Mais uma achega (depois de folhear a última Concilium):
O binómio Esposo/Esposa, sem ser aplicado directamente às relações intra-trinitárias, tem, contudo, um peso significativo na linguagem teológica judaico-cristã. Talvez inspirando-se no seu uso por parte das antigas religiões cananeias, os profetas utilizaram tal categoria para exprimir a intimidade e a responsabilidade na relação entre Deus e o homem. Também S. Paulo se serve dela para descrever a relação de Cristo com a Igreja. Seria desenvolvida, posteriormente, pela espiritualidade monástica para descrever a união íntima da pessoa consagrada com Deus.
Caro Anonymous.
Certamente, Oseias, o Cântico dos Cânticos, as bodas de Caná… João da Cruz etc etc etc…
Mas penso que mesmo a aplicação intra-trinitária tem sentido… A fecundidade da transbordante criação…
A aplicação teológica nunca é directa (face a face…)
Abraço.
Penso que o conceito de «anti-cristão» se aplicaria melhor a um ateu militante... coisa que eu não sou... Não me considero, como tal, «anti-cristão», mas sim «não-cristão» e, mesmo aqui, terei que salientar que isso é uma opção... em tudo religiosa e, portanto, muito mais do que somente consciente... Parti, como todos nós, do mesmo contexto cultural... e por isso medito muitas vezes se os conceitos de «herético» e de «blasfemo» não serviriam também para me definir... Desfaço, em muito, essa possibilidade quando estou certo que a religião a que pertenço é anterior ao cristianismo... falo do culto genérico aos Celestiais (ou Anjos) que tem origem na antiga Suméria enquanto sistema (embora com manifestações dispersas, um pouco anteriores)... mas é evidente que tal religião se tem cruzado secular e ciclicamente com outras religiões, nomeadamente o cristianismo... A forma luciferária de culto aos Celestiais em que tenho Fé... mistura elementos das civilizações primordiais com elementos fundamentalmente judaicos, mas também com alguns elementos cristãos... embora o meu Lucifer em pouco ou nada estabeleça relação com o vosso... Mas, é evidente, que também se alimenta do fundo teológico que deu raíz a todas as religiões abraãnicas...
Quanto aos textos... e à ortodoxia hermenêutica que a tendenciosa tradução da vulgata veio impôr... a questão não é resolvida por uma simples e honesta afirmação de Fé... porque a Palavra determina Mundos! O vosso «Jesus» em muito pouco corresponde a Jesus... e até diria que teremos que afastar as cortinas de 2000 anos de cristianismo para perceber a Palavra e a Vida do Profeta dos cristãos... Na verdade, são apenas mil anos... da queda do Império Romano do Ocidente até à aurora do renascimento... nos primeiros 500 anos e nos últimos não existe cristianismo no sentido teologicamente consequente... basta pensarmos que nos primeiros 500 anos só os miseráveis e os escravos à volta das grandes urbes eram cristãos... permanecendo os rurais a prestar culto aos seus deuses da matriz celto-germana e as elites romanas numa reactiva «renascença pagã»... e nos últimos 500 anos basta pensarmos nas inúmeras imbecilidades teológicas de que se destacam os Dogmas criados à pressão para justificar a imbecilidade do Culto Mariano (puro bezerro de ouro pagão!)... e os inúmeros Papas loucos e criminosos! O Dogma da Imaculada Concepção de Maria (1854) é uma cretinice teológica em tudo pornográfica. Ainda mais vindo de quem veio... Pio IX, um fanático e um déspota devasso que estabeleceu a Infalibilidade Pontíficia (outra cretinice de baixa teologia!) - a isto chamo eu soberba satânica - nesse, de má memória, Primeiro Concílio do Vaticano! Quiçá tão humana raiva... por a Itália ter acabado com os Estados Pontíficios e tê-lo confinado a uma gaiola chamada Vaticano. E a palhaçada - digna de um menino de seminário recém-chegado das branhas - continuou, em 1950, com Pio XII e o Dogma da Assunção da Nossa Senhora aos Céus em Corpo e Alma... ressurreição total! JAJAJAJA!!! Outro déspota, que ao mesmo tempo proibia aos católicos serem comunistas sob pena de excomunhão! Nada há de espantar, pois, no aprisionamento em vida de uma menina camponesa e analfabeta chamada Lúcia... não fosse algum herege psiquiatra diagnosticar as visões da rapariguita de um modo bem mais humano!
Etc...
Caro Lorde.
Fiquemo-nos então pelo “luciferário”, que é tão confuso e ambíguo e repleto de remissões históricas e conceptuais e práticas etc como o termo “ateu” ou “cristão” e etc2.
Acontece que, como muito bem dizes, as palavras criam mundos. Há portanto uma doação e comunidade de sentido qualquer (mesmo que ilógico) nos seus diversos aspectos.
Eu sou um pouco como os leitores de banda desenhada ou coisa que o valha, ou para o caso serve. Vejo Lúcifer como uma revolta inquieta e impaciente perante Deus e a Criação (entre outras coisas, mas para o caso e o que quero dizer, serve2). Como qualquer coisa de prometaico relativo ao universo judaico-cristão.
Quando dizes que o teu Lúcifer tem pouco que ver com o “nosso”, queres dizer que não integras o Deus judaico-cristão – criador e único e etc?...
Eh pá e fico-me um pouco por aqui, dado que o teu comentário implica tanta coisa que, para além de não estar agora com muito tempo, me parece que dialogado ponto a ponto e gradualmente será mais esclarecedor e menos equivocante. Para além evidentemente de me faltarem conhecimentos históricos (por exemplo, dos sumérios apenas li a Epopeia de Gilgamesh na tradução do Pedro Tamen, e tenho uma vaga ideia da questão das runas…) Parece-me é que retirar pertinência histórico-teologica aos primeiros 500 anos do cristianismo é um pouco forçado (Agostinho, Tertuliano, Orígenes e por aí fora e dentro incluindo os evangelhos e anteriores textos judaicos… enfim…)
Apenas uma notas gerais indiciando como vivo e penso tais coisas que referes e que cobrem uma amplitude histórica e conceptual tal que precisaria de me fechar em mim e na biblioteca duma Alexandria qualquer para poder discorrer acerca delas:
- o cristianismo apropria-se das vidas pessoais e culturais na sua execução;
- Machiavel não é estranho ao catolicismo (não no sentido que o senso comum deu a “maquiavélico” ou talvez também, mas sobretudo mesmo o moço renascentista);
- o analfabetismo não é impedimento à inspiração divina, mas configura a linguagem com que essa inspiração será humanamente comunicada;
- o ponto de vista psiquiátrico não anula outros, tal como o estudo bioquímico da experiência estética não anula o seu sentido artístico;
- eu sou evidentemente um vivente apologético da conecção e mútua doação de sentidos das cartas paulinas e dos evangelhos;
- se anular a relação directa com o Deus vivo através da oração, assim como as cortinas de mediação históricas (de 2000 ou 1000 anos, tanto faz) e a comunhão na fé com contemporâneos, penso que a representação de Jesus com que fico é uma pura e pessoal e imaginativa invenção.
E pronto, por ora chega e chaga.
Abraço.
Que bom, um esgrimista polémico! (Bem melhor argumentar aqui, do que no Fórum da Associação Portuguesa de Satanismo - que não contém místicos, mas apenas ateus investidos de uma moral de pseudo-deuses!).
Vejamos...
O «luciferário» é um termo incomum, adentro do luciferismo. No património religioso o termo designa «aqueles que transportam o lampadário numa procissão»... Usar o termo como designativo de uma corrente teológica do luciferismo... é uma audácia que pretende traduzir não só um novo estado - contemporâneo - da mística luciferina, mas, fundamentalmente a recuperação de uma sabedoria primeva, interrompida pelos terrores medievais do demónico e pelos satanismos modernos! (Não posso falar mais abertamente mas...) Integra-se na corrente genérica de Redenção do Mundo e de Reintegração
do Homem a partir da Restauração de Lucifer no seu estado Glorioso anterior à Queda...
Se o meu Lucifer não é o teu... a razão é fundamente teológica: Lucifer não é, nem nunca foi, o Mal Absoluto e, com tudo o que possa ter de prometeico, não é um prometeu, um «deus travesso» e heróico... Lucifer é a Primeira das Criaturas e o Alicerce Cósmico sobre o qual assenta todo este Universo Criado. E não é o causador da Queda de Adão... mas sim Aquele Que Cai com Adão por piedade! A teologia judaico-cristã acerca disto é uma pura mentira... embora os judeus, neste aspecto, sejam um pouco mais verazes... sempre aceitaram que Quem Protege o povo judeu e Moisés no Êxodo... é Lucifer. Como é Ele a Primeira Voz que confiou a Abraão a Revelação dos seus dias futuros de Pai De Um Povo... Etc...
É evidente que Há Um Só Deus... que É, Foi, Será... Mas acima (ou melhor, envolvendo-O) do Deus Único, como moldura que O define... está a Mãe Impronunciável, A Noite Primordial... Sustento Eterno de Deus... A Sua Substância só reside inteiramente Nele enquanto Vida Eterna... mas Deus tem uma Ferida de Sofrimento... Fractura da Sua Substância que Lhe permite Amar as criaturas... «A Noite devassa-O, como ao Anjo e ao Homem e a todos os Viventes e Não Viventes.»
Quanto a Agostinho... já lhe chamaram o último dos romanos e o primeiros dos cristãos! Quanto aos renascentistas... até Galileu se considerava um cristão a tentar ler, não o Livro do Verbo (as Sagradas Escrituras) mas sim o Livro da Obra (o mundo natural).
Quanto às mútliplas interpretações de uma possível manifestação do sobrenatural... a ciência dos homens não pode nem deve ser aqui desprezada... até o Direito Canónino com isto concorda! Mas mais importante é saber que uma parte considerável dos teólogos cristãos - ainda - não dão valor teológico ao Culto Mariano, sendo apenas entendido como uma forma popular e decaída de cristianismo... Basta pensares que a Igreja só aceitou as ditas «Aparições de Fátima» por arrastamento da importância que esse culto tinha ganho... e à época não encontrou nada merecedor de dignidade sobrenatural nas «Aparições».
Quanto à fidelidade aos Textos... ela é fundamental... por risco de se estar a prestar culto a uma efabulação... Existe um Cristo histórico e um Cristo das Escrituras... a diferença entre ambos é tremenda! Para não falarmos na continuada censura de todo o Texto Sagrado que colocava dificuldades à ortodoxia!
S. Paulo... brilhante! Mas um desvirtuador do cristianismo primitivo e histórico!
Tal como S. Francisco... admiro a sabedoria simples dos néscios!
«- se anular a relação directa com o Deus vivo através da oração, assim como as cortinas de mediação históricas (de 2000 ou 1000 anos, tanto faz) e a comunhão na fé com contemporâneos, penso que a representação de Jesus com que fico é uma pura e pessoal e imaginativa invenção.»... Muito pelo contrário, meu caro... aquilo com que ficarias seria a Verdade de Cristo!
«Lux Maxima!»
Caro Lorde.
Primeiro que tudo uma explicitação de como eu vivo e penso estas coisas dos planos ontológicos: os discursos e textos e afins relativos a anjos e deuses e Deus e por aí fora, são para mim indiciadores da relação humana com tais planos, mais do que uma descrição fáctica do ponto de vista e vida de tais planos. Noutro plano, sei lá, por exemplo uma formiga, também não penso nem pretendo ter acesso à sua forma de vida enquanto formiga – o que sente, o que pensa e se o faz, qual a correspondência entre o seu acontecimento em mim e o meu acontecimento nela…
E agora alguns pontos:
1. Teologicamente, o Mal Absoluto seria o nada de ser, e não evidentemente Lúcifer. Em termos de banda desenhada ;) e que é muitas vezes um bom plano discursivo para estas coisas, Lúcifer era o anjo portador da luz divina relativamente às criaturas… Eu não tenho um conhecimento muito alargado da Mishná e da Tora, mas penso que o texto bíblico não se refere a tal, nem à protecção luciferina do povo judeu… Evidentemente que estas coisas dependem muito do sentido exegético e teológico com que se lêem os textos e quais as remissões para outros textos e culturas e etc. Do ponto de vista cristão e da conversão, eu entendo o demoníaco (termo que não associo a luciferino, ou melhor, não identifico) como o que despersonaliza, aliena, faz falhar o alvo (pecar), ou seja e continuando na tradição cristã: o mundo. Este termo não se refere às coisas e actos para aí espalhados no nosso habitat, mas essencialmente a uma forma de orientação existencial que se fundamente nos poderes e prazeres imediatos (à Goethe, que é um bom banda-desenhista). Isto é, o termo “mundo” corresponde a uma forma de vida – isto do cristianismo é sempre interior… Demoníaco é algo que tem que ver com ilusões, aparências, mentiras (o pai da mentira)… A queda é a ressaca das ilusões, e por isso os fins de festa são melancólicos, não porque se perdeu algo mas porque afinal nada lá estava… Isto assim rapidamente dito. Há depois a questão da peculiar forma de temporalidade que somos, o que faz que nunca cheguemos a tempo ao decorrer da nossa vida – quando o apreendemos, já passou… O demoníaco é algo de muito banal e quotidiano… Que isso possa acontecer a anjos, seres espirituais temporais, creio-o por revelação que sim…
2. A Restauração de Lúcifer foi assumida por Orígenes, e é um ponto limite da história da teologia, e desta enquanto actividade do pensamento e da consciência. Isto na História do Cristianismo… Evidentemente – e como todos os pontos limites – esta tese, que tem que ver com a Redenção absoluta da Criação correspondente ao poder infinito de Deus, é uma tese extremamente polémica… No dizer de um padre açoriano: o Inferno (negação existencial de Deus) existe enquanto possibilidade, mas está vazio… Eu não partilho esta tese nem a contrária. Não faço a mínima… Mas gosto destes pontos teológicos que me aguçam a fé, desde que não se os dogmatize…
3. Faz sentido que Lúcifer seja a Primeira das Criaturas, visto ser o portador etc Mas não o vivo nem penso enquanto Alicerce Cósmico sobre o qual assenta toda a Criação. Isto para mim corresponde ao verbo divino, isto é Cristo. É Lúcifer que está assente em Cristo, através do qual todas as coisas foram feitas bla bla bla. É assim que ressinto, por exemplo neotestamentário, a familiaridade e cordialidade com que Jesus fala com o Diabo no deserto ou com o famoso Legião que depois manda literalmente ir com os porcos… É com o farisaísmo (forma de representação discursiva da lei que não corresponde a nenhuma forma de vida) que Ele é violento e agressivo… O que não significa evidentemente uma concordância de ser, vida e sentido, ou qualquer aceitação positiva do pecado… Eu um dia penso que farei um post acerca disto…
4. O causador da queda de Adão (o humano, isso é claro no texto hebreu, quero dizer, dizem os exegetas que eu não sei hebreu…) é a sua própria vontade… Não sei bem como é que Lúcifer andou metido ao barulho (isto é, qual afinal o sentido da serpente). Essa da piedade é curiosa…
5. “Mas acima (ou melhor, envolvendo-O) do Deus Único, como moldura que O define... está a Mãe Impronunciável, A Noite Primordial... Sustento Eterno de Deus... A Sua Substância só reside inteiramente Nele enquanto Vida Eterna... mas Deus tem uma Ferida de Sofrimento... Fractura da Sua Substância que Lhe permite Amar as criaturas... «A Noite devassa-O, como ao Anjo e ao Homem e a todos os Viventes e Não Viventes.” – Bem, aqui então certeza nenhuma me há de acompanhar até à morte… A relação entre Deus e aquilo que Ele não é, é um dos mais violentos paradoxos religiosos. Por vontade Sua, Deus devassa-se na Criação até à encarnação e à cruz, é certo cristologicamente… Mas a Mãe Impronunciável , a Noite Primordial, não é nem cronológica nem lógica nem vivencialmente anterior a Deus… Sei lá… Os teus termos, aqui, são de uma beleza avassaladora…
6. Discordo totalmente dessa leitura de S. Paulo, que considero consistente com os evangelhos. Aliás, estes não foram escritos “antes” (o documento mais antigo do Novo Testamento é precisamente uma carta de S. Paulo). O Novo Testamento é um conjunto de documentos que corresponde à constituição e vivência das primeiras comunidades cristãs… O que sabemos de Cristo é-nos dado por eles. Anulá-los e pretender assim configurar o Jesus verdadeiro e puro é um golpe de imaginação sustentado no próprio que o faz (a não ser que estejamos a falar de iluminações e visões, não sei…) Lembro-me aqui do D.H. Lawrence, do Pascoaes, do Nietzsche, e tantos outros, que pretendem exactamente que S. Paulo é um desvirtuador da pureza jesuânica…
Ufa! E chega por ora!
“Lux Máxima!” – evidentemente, mas nunca esquecendo que sou cego e coxo e mudo (que é que tu queres, sou cristão…;)
Abraço.
«Teologicamente, o Mal Absoluto seria o nada de ser»
Isto quer dizer, então, que a criação a partir do nada, feita por Deus, consiste na criação a partir do Mal.
Assim, no principio não era o Verbo. Era o Verbo e o não-Verbo.
Caro Anonymous.
Eu aí, começaria pela interrogação ao embaraço das palavras, que por vezes linguisticamente produzem falácias que aparentam sentido mas… Digo começaria, porque é sem dúvida uma temática difícil… Mas o que você diz corrsponde mais ou menos a: O não-ser é… O que pode ser dito, mas não sei se pode ser pertinetemente pensado. Penso que sim, mas terá (se quiser) de explicitar-me melhor o seu pensamento… Deus não criou a partir do nada, mas do nada a partir de Si, como me parece evidente…
Enfim… Bom reparo…
Abraço.
Deus criou a partir de Si, diz o Vítor. Isto parece-me que é uma perspectiva, de Deus, tendencionalmente emanentista, na medida em que apesar de Deus não ser o Mundo este seria uma derivação de Si mesmo, e não uma criação propriamente dita.
Lembra um pouco a visão de Plotino, e não tanto a visão cristã de um Deus absolutamente transcendente, que criou algo diferente de Si. Até porque feito à sua semelhança e imagem só foi feito o Homem.
Agora, parece-me que se o Mundo não é uma emanação de Deus, então este teve de o criar a partir do Nada, isto é, a partir do Mal. Mesmo que este, enquanto ausência de ser, não seja ou não possa ser pensado. Aliás, é o Vitor que começa por afirmar que o não-ser é, quando diz que «o Mal absoluto SERIA o nada de ser».
Mas a razão para estes paradoxos não tem nada de transcendente. Foi a fusão entre a metafisica cristã e a metafisica grega que conduziu a tais paradoxos. O que aparenta ser paradoxal só o é porque o Deus cristão foi identificado com o Ser grego. Assim, ou Deus (Ser) é tudo (porque tudo é), ou não é tudo e por isso este «tudo» não é (porque não é Ser). Ou, como terceira possibilidade, Deus não é o Ser, mas sim um ente como tudo o resto. Mas então Deus não criou o mundo a partir de Si, mas sim a partir de outra coisa qualquer, que não o Nada.
Enfim, o «mal» foi o Santo Agostinho ter-se inspirado em Plotino. A imanência plotiniana entra em conflito com a transcendência cristã.
Caro Anonymous.
Primeiro, a utilização do imperfeito (seria) corresponde precisamente à não liquidez do ser-nada. Ou melhor, segundo, primeiro é: Bom dia!
Bem, é evidente que a gramática dos nossos conceitos tem historicidade. Mas o que me interessa nessa tomada de consciência não é a desresponsabilização pessoal de tais concepções, retirando a água do capote para cima de Plotino ou Agostinho ou outro caramelo qualquer. A questão religiosa é: como me oriento eu próprio, aqui e agora?... E a questão é paradoxal no meu próprio pensamento, e não apenas na síntese histórica entre a transcendência do Deus judaico-cristão com o Deus neo-platónico, aristotélico, com o ser parmenidiano, etc (ou dando saltos históricos, no monismo espinosista ou na monada leibniziana, nos fluxos deleuzianos ou no seu percursor obscuro, nas figuras psicanalíticas, e em milhares doutros elementos histórico-filosóficos). Aliás, essas sínteses não são apenas acasos e ocasos históricos, mas pertinências da história do pensamento. A concatenação histórica ecoa concatenações conceptuais, e ambas ecoam em mim próprio, e a mim próprio. E isto, mesmo que eu não tenha, sob a forma do conhecimento directo e ilustrado, consciência dessas relações histórico-filosóficas e científicas. Como se sabe, não é preciso conhecimento científico da obra de Freud para orientar-se pela tese do recalcamento – anda no ar que respiramos, é essa aliás a noção viva de cultura…
Eu diria que há uma imanência transcendente de Deus na criação.
Quero dizer que entendo o “a partir do nada” da revelação como significando que fora Deus e a criação (todas as coisas visíveis e invisíveis) não existe, não há, não é, não vive, não se apresenta… coisa nenhuma. Daí que tudo o que existe tem ou participa duma qualquer imitação de Deus (não imagem, que isso é outra conversa). Mas não no sentido duma emanação, que remete para uma decorrência directa e imanente como o fumo do fogo, mas no mistério do acto da criação, na infinita dissemelhança do não-criado para o criado. Mas essa dissemelhança não significa nem desligamento nem indiferença da divindade. Deus está presente na criação como algo que se distingue absolutamente desta. A imagem que me vem agora à pinha é a evidente da presença da pessoa real do artista na sua obra…
Não digo que esta imanência transcendente é pensável ou representável; digo que o sei por fé, revelação. Se for transcendente não se relaciona pessoalmente comigo; se for imanente não difere dos modos naturais e não os supera. Ora, eu vivo-O como execução destes dois pólos, paradoxais é certo mas… bem, isto seria matéria para mais uns centos de comentários ;)
Abraço imanente na transcendência (eh eh).
É pá, também quero um pedaço desta carne! Cá voltarei... Deus criou a partir do Mal? O Nada, o Não-Ser (não são a mesma coisa») são um mal? São o Mal??
Meus caros cristãos... acho que a vossa sorte... é que depois do cristianismo ter feito o genocídio das pessoas como eu... deixou de necessitar de uma «confraria de inquisidores»!
P. S. Deus criou a partir de Si algo diferente de Si... e só o homem é à Sua imagem e semelhança?
Complicatio/explicatio? JAJAJAJA!!!
Monseigneur.
A tese (alô, Aurélio) é que o mal não é substancial, não é algo de primeiro - mas uma ferida do bem, um menos ser.
Palavras, palavras - dependem do seu uso e contexto. A que nada e não-ser te estás a referir?...
E pois, os genocídios... Assumo-os e condeno-os: culpa. Mas inquiri será sempre uma urgência da fé.;)
Quanto às semelhanças, implicam evidentemente dissemelhanças - não é uma relação de igualdade. Tudo tem uma semelhança com Deus, numa infinita dissemelhança (infinita e não total).
A imagem, é outra coisa. Aqui, trata-se do espírito (não me refiro à voláteis alminhas desencarnadas...)
Complicatio / explicatio - sempre.
É uma das características da linguagem.
Abraço.
ja deixei comentário. talvez em seção outra. transferir, por favor:"simplício simplório dos sonsos".
lá deixei comentário. não intendo praticamente nada desta comunicação; talvez tenha enviado para destino outro dentro deste blog, favor destiná-lo para "etimologia 2" se for o caso:"simplício simplório dos sonsos".
"em seção outra", quero dizer, "ser cristão", urbi et orbi", "julho 2008", mas não achei.transferir, por favor:"simplício simplório dos sonsos".
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