segunda-feira, março 15, 2010

Deus absconditus


a Karl Barth


Quando pensamos que sabemos, de Deus nos afastamos; quando calamos o que pensamos saber, não clamamos por Deus.

A religião é isto.

O que nos distancia de Deus (mais até do que a agnóstica despreocupação, seja ela autenticamente possível ou não) e o lugar onde se clama por Ele.

A ideia de que o acesso directo (ou até, nos casos mais graves de idolatria, o próprio Deus) se dá nos conteúdos objectivados de textos bíblicos, da tradição ou conciliares, da prática religiosa e suas regras - está a milhas da fé. Ou melhor dito: a dar-se seja onde e como for, nunca por tal é condicionado.

E está certo assim: a temporalidade - e a religiosidade, à morte pertence - assim determina; mas não esqueçamos que não é de Deus, mas nossa.

Os únicos dons directos de Deus são o ser, a fé e o amor - que pertencem à vida, e nesse sentido são ilimite doado.

A maioria dos enunciados doutrinais não respondem a nada quando tentam definitivamente responder. A esfinge boceja, pois ninguém a ela se apresenta, pretendendo ainda por cima tê-la superado, já passado por ela. Mas o crivo do enigma acabará sempre por constituir a interrogação final, depois de todas as afirmações – excepto uma, que aí, sim, contenha todas as outras.

O que não significa que incautamente nos passemos de doutrinas e dizeres: aquele que ama sabe que tem de organizar-se no discurso e na acção para temporalizar o amor, buscá-lo e por ele ser descoberto; mas se se mantiver no amor, saberá também que toda a fixação em fechamento doutrinal corresponde ao assassínio do amor e à desvitalização do espírito.

Dito de outro modo: quando a verdade se retém no alfa, torna-se falsidade soçobrada no ômega.

Ou ainda, sobre tudo: sangue forte, eucarístico.